Sustentabilidade vira moeda de troca do produtor com nova CPR Verde

Segundo estimativas do Governo Federal, modalidade da Cédula de Produto Rural tem potencial para movimentar até R$ 30 bilhões nos próximos quatro anos

Sancionado em 1º de outubro, o decreto federal 10.828 incorpora novas possibilidades no leque do produtor rural que quer usar a sua sustentabilidade como moeda de troca via Cédula de Produto Rural, ou CPR Verde.

“Em 1º de outubro de 2021 foi sancionado o decreto federal nº 10.828 para regulamentar a emissão da chamada CPR Verde, a Cédula de Produto Rural, que é relacionada às atividades de conservação e recuperação de florestas nativas e os seus biomas”, contextualizou o advogado Pedro Puttini Mendes, doutorando, professor de pós-graduação de direito agrário e ambiental e sócio-diretor da P&M Consultoria Jurídica, no quadro Direito Agrário exibido nesta terça, 19.

Primordialmente o especialista explicou o conceito do decreto federal. “É uma legislação bastante inovadora. E uma legislação que, também como diziam outros especialistas no assunto, é bastante criativa, embora relativamente simples. Ela traz uma regulamentação e uma operacionalização a uma modalidade de CPR que se define como sustentável, que pode movimentar, segundo estimativas do Governo Federal, até R$ 30 bilhões em quatro anos”, informou.

CPR: O QUE É?

Depois disso, Puttini detalhou o que é uma CPR. “A Cédula de Produto Rural é um título que representa uma promessa de entrega futura de um produto agropecuário, funcionando como um facilitador na produção e na comercialização rural”.

“Ou seja”, continuou o especialista, “um banco ou outro intermediador adquire essa CPR, antecipa os recursos ao produtor ou à cooperativa que negociou essa CPR, que se compromete a entregar a quantidade e a qualidade estipuladas nessa CPR. Ou se for uma CPR chamada de financeira, resgatar financeiramente essa cédula na data de seu vencimento e, assim, com esse documento, que nós consideramos a CPR, viabilizar a produção e a comercialização da sua produção por meio da antecipação de crédito rural”, detalhou.

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QUAL O VALOR DE UMA CPR?

Nesse sentido, o consultor jurídico explicou como o valor de uma CPR pode ser apurado. “É preciso que conste todas as condições exigidas pela legislação, como, por exemplo, a quantidade do produto utilizado como referencial, o preço, a instituição que divulga o preço ou o índice de preço, a praça ou o mercado de formação desse índice e alguns outros requisitos também”, apontou.

ONDE ELA PODE SER USADA?

Juntamente com o seu valor, o produtor deve saber para que situações a CPR pode ser acionada. “A Nova Lei do Agro, sancionada no ano passado, 2020, ampliou a abrangência da antiga CPR, já que a nova CPR […] ampliou os produtos que podem ser negociados, as pessoas legitimadas para emissão das garantias, a emissão eletrônica e algumas outras novidades. E, nesta ampliação, nesta abrangência que a Nova Lei do Agro trouxe no ano passado, incluiu-se também os produtos obtidos nas atividades relacionadas à conservação de florestas nativas e seus respectivos biomas, o mesmo texto que foi agora regulamentado. E também com relação ao manejo de florestas nativas no âmbito do programa de concessão de florestas públicas. Por isso agora surge, então, essa regulamentação (da CPR Verde)”, relacionou Puttini.

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Bem como a legislação tem o potencial de facilitar uma negociação entre produtores rurais e empresas que buscam atuar no setor, a CPR Verde também reforça a sustentabilidade da agropecuária brasileira. “A novidade traz resultados de curto prazo, com a captação de recursos e a preservação de áreas ambientais, como também cria um instrumento de combate a esse discurso crítico contra o agronegócio brasileiro, quanto à questão da conservação, na questão da sustentabilidade”, analisou o especialista.

NA PRÁTICA, O QUE SIGNIFICA A CPR VERDE?

Segundo o consultor Pedro Puttini, a novidade indica “que um produtor que tenha um projeto de conservação de vegetação nativa, por exemplo, vai poder transformar essa iniciativa num ativo para ser negociado com uma empresa ou uma instituição que queira fazer, por exemplo, a compensação de carbono ou proteger determinada área de interesse da biodiversidade”.

Igualmente, “o produtor acaba sendo estimulado a produzir ao mesmo tempo que preserva e ainda passa a receber pelos serviços ambientais que prestou. Assim ele obtém uma renda extra e permite ainda que as empresas interessadas em mitigar essas suas emissões de gases de efeito estufa comprem os títulos mediante um compromisso do produtor em manter essa área conservada”, completou.

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PONTOS NEGATIVOS

Em contrapartida, enquanto facilita as negociações e incentiva a recuperação e preservação ambiental, a legislação tem algumas falhas a serem corrigidas, segundo a interpretação do advogado. “Analisando detalhadamente essa novidade, a escolha de decreto para alguns procedimentos da CPR Verde, em algumas situações, não parece a via mais adequada”, constatou.

De acordo com Puttini, a CPR Verde apresenta conflitos normativos. O consultor justificou sua análise. “De um lado a CPR é um título para entrega de coisa líquida e certa, exigido pela quantidade e qualidade do produto estipulados pela CPR. Ou, no caso da financeira, para pagamento de preço calculado sobre o produto. E a lei que se propôs a regulamentar, a Lei da CPR, de 1994, ela não prevê a possibilidade do emitente assumir, por meio da CPR, uma obrigação de fazer ou não fazer alguma coisa, mas só entregar alguma coisa, como, por exemplo, o produto rural ou pagar, no caso, um valor”, comentou. “Então ainda vão caber algumas discussões nesse sentido para amadurecimento da legislação”, projetou.

“Nesse sentido, seria melhor detalhar, no caso de redução do desmatamento ou degradação da vegetação nativa, de determinada área, qual o tempo, qual a forma de auferir a conservação da biodiversidade. Ou recursos hídricos ou o solo de uma área, a mesma especificação de como auferir”, ilustrou.

Por último, o consultor jurídico disse que espera que algumas mudanças da legislação possam tornar o uso do dispositivo mais seguro. “Toda essa crítica se deve ao fato de que a CPR, enquanto título executivo, um ativo financeiro, precisa representar uma transação bem segura, e não apenas uma intenção. Mas nada impede que a intenção seja declarada, definida. Então são essas as novidades. Esperamos que muitos produtores ainda sejam beneficiados por essa nova legislação”, estimou.

Pelo vídeo a seguir é possível assistir os comentários de Pedro Puttini sobre a CPR Verde na íntegra:

Imagem: Reprodução / Prefeitura Municiapl de Assú-RN