“Vai ser uma pessoa ainda melhor”, diz 1ª locutora de rodeio sobre vencer o câncer

Conheça a trajetória de Mara Magalhães, primeira locutora de rodeios do Brasil e do mundo, da infância em Monte Azul Paulista-SP até a carreira de sucesso

Entre tantos obstáculos já superados por Mara Magalhães, o câncer foi apenas mais um adversário superado que torna sua trajetória mais admirável. Nesta quarta-feira, dia 19, a primeira mulher locutora de rodeios do Brasil e do mundo concedeu entrevista ao Giro do Boi para lembrar de suas raízes ligadas ao campo, a primeira vez que entrou na arena como locutora e compartilhar as lições aprendidas a partir dos desafios pelos quais passou.

Natural de Monte Azul Paulista-SP e nascida coincidentemente no dia que ocorria uma das edições da Festa do Peão de Barretos, Mara foi criada no sítio de seu avô, uma época da qual tem saudade, conforme recordou. “Eu tenho saudade de acordar de manhã, descalça mesmo, e sentir o orvalho e correr no meio da horta do meu avô. […] Tenho saudade também de subir no pé de seriguela, tenho saudade de uma piscina que o meu avô tinha, que era a única que tinha na cidade. Eu acho que o meu avô era um cara que fazia networking e era muito visionário. Então só tinha uma piscina (na cidade) e, aos domingos, todas as famílias, quem quisesse, ia lá nadar nesta piscina. Então a gente convivia diretamente com a natureza”, lembrou.

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Conforme admitiu a locutora, a criação no campo deu asas às peraltices da infância. “A gente caçava cobra e pegava coral na mão. Éramos eu, meu irmão e meus dois primos. […] Eu fui picada também por uma caranguejeira. Foi quando vinha chegando visita e eu fui lavar o banheiro – porque quando ia chegando alguém, era uma alegria muito grande – e a caranguejeira estava debaixo do balde, caiu no meu pé, me picou. Dor igual aquela… […] Nós aproveitamos muito. Eu acho que essa essência do homem e da mulher do campo, de querer estar próximo das pessoas e querer se ajudar, não desmerecendo quem mora na cidade grande, mas quem tem esse privilégio é diferenciado porque a natureza traz uma conexão diferente. Você ouve os passarinhos, é diferente e traz paz. Eu, graças a Deus, fui muito privilegiada. […] Nós tínhamos carro de boi e um dia eu pensei em pular do carro. Rapaz, mas foi um tombo! Eu era muito peralta e muito feliz”, celebrou. Aliás, o pioneirismo de Mara parece que é predestinado. Ela revelou ao Giro do Boi que sua avó também foi desbravadora. “A minha avó foi a primeira mulher no Brasil ou no mundo a plantar laranja”, observou.

Juventude ligada ao campo moldou o destino de Mara.

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Foi neste meio que Mara cresceu e começou a tomar gosto pelo setor de modo que fizesse parte não só de sua vida pessoal, como também a profissional. “Eu conheço rodeio desde a época em que ele era do circo. Meus pais levavam. Eles gostavam de música sertaneja, ambos eram vizinhos de terra e se casaram. E os nossos passeios eram no rodeio do circo. E depois o rodeio evoluiu e a gente ia para as fazendas. Depois o rodeio começou a acontecer nas cidades. […] Tinha festinha aqui em Bebedouro onde vinha Roberto Carlos, Sandra de Sá, todos eles. […] Então eu tive um gosto pela arte, pela música, pelo rodeio e pelos animais. […] Foi um misto de coisas, porque a gente não só vivia no meio do mato. Quando tinha um show… eu lembro até hoje, eu, minha mãe e meu irmão. E eu em cima do ombro do meu pai assistindo Roberto Carlos”, relatou.

VOCÊ TEM A VONTADE, MAS TEM A CORAGEM?

Questionada sobre sua primeira vez na arena como locutora, Magalhães contou como foi a ocasião. “Foi emocionante! Falaram para mim que precisavam de um locutor e perguntaram: ‘Você tem a vontade, mas tem a coragem?’ Eu falei que era pra já! Eles perguntaram se eu sabia falar, mas eu sabia dois versos de rodeio. Só que quando abriu a porteira, eu mandei ver”, disse.

“Eu acredito que eles (profissionais do rodeio na época) se assustaram porque foi em 1988. Porque hoje as mulheres estão lutando pelo empoderamento, mas eu nem sabia o que era essa palavra. E eu fui. Mas é o que eu te falo: não crie a criança no sítio, não, meio misturado com a cidade… que ela fica bem corajosa!”, brincou.

Para começar a carreira, Mara combinou a vontade com a coragem.

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TOMBO DA VIDA

Acostumada a passar a emoção dos oito segundos dos peões sobre o lombo de bois e cavalos, foi a própria Mara quem quase levou um “tombo da vida” em 2017, quando descobriu que estava com câncer nos ovários. “Foi terrível o câncer. Eu fui à igreja, pois sou muito religiosa – eu sempre fui, porque lidar com boi cara a cara não é brincadeira, não, tem que ter fé – e então eu senti uma dor nas costas. E eu agi rápido. Na segunda-feira eu fiz os exames. Mas mesmo assim eu tinha a minha agenda de rodeios. Eu fiz três meses de rodeios até chegarem os resultados. Quando eu cheguei a Monte Azul, a minha barriga estava como a de uma grávida de nove meses pelo tamanho do câncer. […] Aí eu liguei para o Henrique Prata e ele rapidamente me encaminhou, fizemos os exames e não falaram que era câncer, falaram que iam remover aquilo, um cisto daquele tamanho, do tamanho de uma criança. Mas iam ter que cortar a barriga inteira. Mas eu disse que tudo bem se eles tivessem que cortar, eu só queria ficar viva. E foi aquele drama”, disse.

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Com a cirurgia feita e o cisto removido, Mara retornou ao hospital depois de um mês. “Eu voltei e pensei em dar um abraço e fui toda maquiada, de chapéu, ‘daquele jeito’. E aí eu cheguei e me falaram que tinham uma notícia para me dar. […] Eles disseram que eu estava com câncer. ‘Como?’ A ficha caiu, eu comecei a chorar, a ‘make’ se desfez, formou um caminho no meu rosto e fez, sem exagero, uma poça no chão. E eles perguntaram quando eu podia começar a quimioterapia. Eu disse que naquela hora. ‘O meu nome é pronto e eu vou tratar agora’. Porque o que mata as pessoas é postergar. Amanhã não, é hoje! Vamos cuidar e tratar hoje. […] Para ter ideia, eu recebi a notícia às 7h e eu só consegui sair de dentro do carro e voltar para a minha casa e contar para a minha família às 19h. Eu não conseguia pelo baque, que foi muito forte”, destacou.

Mara revelou que preferiu passar sozinha pelas sessões de quimioterapia. “Disseram a mim que eu ia começar a quimioterapia em uma quarta-feira e dali a oito dias eu não ia ter cabelo nenhum. Eu disse que tudo bem. Eu fiz a primeira quimioterapia. […] Eu ia sozinha, porque é sofrido para quem fica lá fora e me disseram que eu era muito corajosa. Tem que ser corajosa”, ressaltou.

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Magalhães salientou que dentro do processo de combate ao câncer existe um ponto muito importante que pode definir o sucesso do procedimento. “Eu quero deixar uma coisa clara para as pessoas: muitas pessoas morrem no momento em que cai o cabelo. Muitas pessoas se entregam no momento que cai o cabelo. Caiu o cabelo, o psicológico abalou! O meu abalou, mas eu não estava nem aí. Eu fiquei com 140 kg. Eu pensei que não estava nem aí. Eu queria ficar curada. Ficando curada, depois tudo volta ao normal”, frisou. “Não é de Deus a doença, mas cabe a nós lutarmos, batalharmos e passarmos essa mensagem positiva, passar essa garra de vontade de viver”, enalteceu. Na foto ao lado, Mara mostra que mesmo em meio à quimioterapia, não perdeu o sorriso do rosto.

Depois de levantar de mais um tombo na arena da vida, Mara contou como percebe hoje o sentido de sua passagem pelo mundo. “A felicidade! Mais do que nunca, com a pandemia, depois disso tudo que eu superei, eu acredito que o mais importante na vida é ser feliz. Independente do poder aquisitivo ou não. Respirar, ser feliz e ter paz, independente de qualquer coisa. […] Eu tive Covid e uma das coisas que mais me impulsionaram foi pensar na minha infância e em tudo que eu vivi. Eu coloquei a minha mente na fé, ajoelhei, pedi, orei. E eu já estou acostumada a passar pelas provações, então a coisa mais linda que existe mesmo é o carinho, é o amor”, refletiu.

Para a locutora, a pessoa que vence a batalha contra a doença não volta a ser a mesma, mas no sentido positivo. “Ninguém que tem um câncer e que é curado volta a ser igual – fica ainda melhor! Por isso que quem está vendo a gente aí, vai ter força para passar por isso porque você vai ter um milagre para contar e você vai ser uma pessoa ainda melhor”, estimulou.

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A entrevista completa com Mara Magalhães pode ser vista pelo player a seguir: