Em entrevista concedida ao Giro do Boi nesta quarta, dia 1º, o zootecnista Guilherme Marquez, gerente nacional de produto leite da Alta Genetics, participou de uma sessão com perguntas e respostas.
Além disso, o especialista também ofereceu sua visão sobre o desempenho do setor leiteiro em 2021. Conforme analisou, a média de valorização do produto no ano está positiva, embora tenha havido inflação dos custos de produção. “Para se ter uma ideia, esse custo de produção subiu mais de 15% nesse ano. Então isso é impactante. Isso está focado muito em combustível, energia e alimentação”, comentou.
Contudo, Marquez acredita que o desafio deve servir de lição ao produtor. “Nós precisamos começar a avaliar o ano, e não o mês. […] O produtor de leite precisa entender que ele precisa organizar o lado financeiro dele. Eu falo muito porque a gente é muito bombeiro. A gente acorda, vai tirar o leite, tem que ir na cooperativa, depois comprar remédio. A gente faz o cotidiano muito bem feito, mas não dá tempo de a gente planejar e olhar para o passado”, advertiu.
Em seguida, Marquez sugeriu que o pecuarista invista mais tempo e energia no planejamento da atividade para superar desafios como os de 2021. “Pare toda segunda-feira, olhe para o passado, veja o quanto choveu […] Veja como está o preço de soja, o preço do milho e como isso vai impactar o seu negócio. Vai dar para comprar antes? Vai dar para armazenar ou não? Será que dá para eu fazer uma negociação melhor em feiras? Hoje as cooperativas fazem feiras de negócio em que você pode negociar melhor”, disse Marquez, dando exemplos de como melhorar o planejamento.
O zootecnista disse em resumo qual sua retrospectiva sobre a pecuária de leite em 2021. “Nós tivemos queda de preço, que se comportaram como todos os anos. A média de preço ficou empatada, mas nós tivemos um aumento de custo de produção enorme. O que leva a gente melhorar a nossa administração”, sustentou.
Nesse sentido, Marquez salientou que a pecuária de leite já evoluiu, mas precisa distrbiuir melhor essa melhoria pelo país. “Nos últimos dez anos, nós diminuímos a quantidade de vacas em muito. Nós chegamos a ter 22 milhões de vacas leiteiras no nosso país. Hoje a gente está próximo de 16 milhões. Mas sabe o que aconteceu com a produção? Ela triplicou!”, exaltou o especialista.
“O que está acontecendo? As grandes fazendas […] estão investindo em melhores animais através do melhoramento genético. Elas estão investindo em um melhor ambiente […]. Elas estão investindo em melhor alimentação e sanidade. Então nós precisamos mudar esse cenário”, apontou Marquez.
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Logo depois, o zootecnista respondeu dúvidas dos telespectadores:
– Qual seria a melhor pastagem para utilizar na criação de gado de leite? (Frank Menezes, de Porto Velho-RO)
Marquez: Primeira coisa: quando você faz a escolha de uma pastagem, tente escolher uma pastagem que tenha mais proteína. É o mais caro da alimentação. E aí a energia você consegue corrigir através da introdução de outros produtos de matéria seca. Mas uma coisa que chama atenção: qualquer pastagem que você for colocar, […] entenda qual é o manejo desta pastagem. Entenda sobre a sua qualidade de solo, o seu clima, a quantidade de chuva para que você possa expressar o melhor daquela pastagem. Eu conheço fazendas de leite que utilizaram o velho Braquiarão e têm uma ótima média. E eu conheço fazendas de leite que utilizam Tifton e não têm uma boa média. O que muda? Muda muito a parte de manejo desta pastagem. Não é só a altura de entrada ou a altura de saída, e sim o manejo daquele solo e daquela pastagem. Então aprenda a manejar pastagem, qualquer que seja ela. E se você puder escolher entre todas as opções que nós temos, dê um foco para você ter uma pastagem com maior teor proteico. Porque a proteína, para o leite, é a comida mais cara que nós temos.
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– Qual raça devo usar para bovinocultura de leite? […] A maioria aqui do gado aqui é mestiça com produção média de quatro litros por dia. (Jean Faustino, secretário de agricultura de Mombaça-CE). A pergunta segue a mesma linha de outra questão enviada por Josimar Ferreira, de São José do Belmonte-PE. Ele está iniciando a pecuária leiteira em sua propriedade e quer saber qual a melhor raça para o Nordeste.
Marquez: O Ceará tem mais de três fazendas no top 100 das maiores produtoras de leite do nosso país. Então o que essas fazendas estão usando? Nós temos uma fazenda de Guzolando e uma fazenda de Girolando aí na sua região. E essas fazendas estão com média muito superiores a quatro litros por dia. […] Nós temos com o Guzolando médias normais de 21 kg de leite em animais meio-sangue Guzerá com Holandês. Então, no Ceará, também é muito tradicional no Guzerá, animais que vão muito bem naquela região. Pode ser uma opção. E tem outras fazendas que estão utilizando o Girolando meio-sangue e ⅝.
– A maioria das minhas vacas são Jersolando e Girolando. Gostaria de saber qual raça de touro seria a melhor pra cruzar com elas, levando em consideração que quero bezerras boas em produção de leite e bons bezerros para abate. (Nilva Ferreira, de Anápolis-GO)
Marquez: O primeiro ponto: dupla aptidão, na minha crença e a partir dos meus dados, não funciona muito bem. Ou você tem um animal que vai ter habilidade de corte ou um animal que vai ter habilidade de leite. Mas é o que nós temos aí são as Jersolando e as Girolando. A Jersolando provavelmente tem um tamanho mediano para pequeno. E quando eu vou falar de animal de corte, eu preciso ter um animal que tenha o ganho de músculo muito rápido para que eu possa fazer o abate. Com as Girolando, eu já tenho um animal maior. O que usaria? Eu usaria o touro Girolando ⅝ em cima das Girolando e eu optaria por usar nas Jersolando um animal mais focado no corte. Para não dar problema de tamanho, eu entraria com o Sindi nas Jersolando. E nas Girolando, com o Girolando ⅝ para que eu pudesse pegar os machos e colocar num sistema melhor de alimentação, um confinamento, por exemplo, para ter um ganho de peso mais rápido, mais precoce e movimentar esse dinheiro dentro da fazenda.
– Dá jogo cruzar um touro Girolando ⅝ em vacas Guzolando?./ (Matheus Schuenk Nunes, de Faria Lemos-MG)
Marquez: Dá jogo, sim. Infelizmente nós ainda não temos o touro ⅝ Guzolando. Nós estamos fazendo parceria com fazendas de Guzerá em que a gente vai fazendo o ¼ Guzolando para botar um Holandês e fazer um ⅝. Precisamos organizar a associação para que isso seja registrado. Mas até lá, dá jogo, sim! Apesar de que você vai ter um tricross. Nós vamos ter uma segunda raça zebuína sendo colocada junto com o Guzerá e com o Holandês. Mas dá certo, sim!
– O bezerro fruto de um acasalamento do Sindi com Girolando é melhor para comércio que um filho de touro Gir? Isso pensando no macho pra fazer dinheiro e as fêmeas para recriar. (Avelar Ferreira, de Palmópolis-MG)
Marquez: Nós conversamos sobre isso ontem com a equipe técnica de leite e é impressionante como isso tem dado resultado. É uma terminação. Eu uso o touro Sindi e ele vai proporcionar uma orelha menor. E infelizmente, para o comprador de boi, muitas vezes ele olha e pensa que o gado girado não dá muito resultado na balança. Ele tem mais osso e couro do que o músculo da parte de se aproveitar. Quando ele coloca o Sindi, como o Sindi tem uma taxa de mantença menor, ele acaba engordando mais e traz uma orelha pequena e animais mais padronizados. Olhe, está certa a sua colocação! Eu estou até espantado de falar isso, mas realmente eu estou falando com dados concretos de coisas que eu vi e presenciei.
– Eu fiz um experimento onde peguei algumas novilhas do meu plantel, Girolando e Guzolando, e estou acasalando com touro Nelore. Eu quero utilizar as fêmeas F1. Neste caso, volto com touro Nelore ou indicaria outro cruzamento? Lembrando que estamos no Seminárido cearense, com longa estação seca, mas suplementamos durante a seca e tempos disponibilidade de forragem, principalmente à base de Andropogon e Urochloa agora que está chegando o período das águas. (Erlan Weine, produtor de Leite e projetista de Jucás-CE)
Marquez: Para mim, esse cruzamento que você utilizou é um cruzamento para terminação. Quer dizer, você vai ter animais para abate, animais que vão ganhar carne e não vão produzir leite. Nós não temos ainda o Nelore com avaliação de leite. Nós temos habilidade maternal do Nelore, que vai fazer um bezerro ser melhor criado. Mas se você está focando para produzir leite, eu voltaria nessa F1 o Holandês para a gente conseguir ter um animal de maior produtividade, maior especialização na produção de leite. Agora se você quiser manter o abate, aí, sim, continue com o Nelore para que a gente possa fazer o abate desses animais.
– O gado da raça Normando se adaptaria em nossa região? São vacas boas de leite? Segunda pergunta: posso inseminar as vacas Jersey com a raça Sindi? (José Amarildo, de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri em MG)
Marquez: O Normando vem da Normandia, ali da França. São animais taurinos que exigem um pouco mais de ambiência para poder expressar toda a sua produtividade. […] O Normando, sim, é uma raça produtora de leite, e é uma raça francesa. E ela tem uma certa rusticidade, vai bem principalmente com o cruzamento de zebuínos. Agora Jersey com Sindi é bacana de entender essa história porque isso começou há muitos anos. Quem é mais antigo na produção de leite vai lembrar do programa Pró-Cruza, do Governo Federal, em que ele orientava o produtor a pegar o zebuíno de leite com o taurino de leite. E apontava qual taurino e zebuíno poderiam ser cruzados. E veja que interessante, isso é novidade. O cruzamento das raças Sindi com Jersey, naquela época, se chamada Jerdi. E ela era registrada pela Assoleite pelo programa Pró-cruza. Você pode fazer isso. A gente já faz isso há mais de 40 anos e o resultado é muito positivo.
Por fim, assista a entrevista completa com Guilherme Marquez, incluindo a sessão de perguntas e respostas na íntegra: