Ao passo que a pecuária se profissionaliza para fazer frente às atividades rurais concorrentes, como a própria agricultura, a margem do produtor é construída com base nos detalhes. Em entrevista ao Giro do Boi nesta terça-feira, dia 15, o médico veterinário e doutor em ciência animal e pastagens Flávio Castro, diretor de operações e pesquisa da Agrocria Nutrição Animal e Sementes, falou sobre um desses pormenores: mais do que o uso da suplementação, a escolha de um insumo adequado que combine com o momento de desenvolvimento em que está a forrageira.
“É uma questão muito preocupante porque no Brasil a produção de pastagem oscila durante o ciclo estacional. A gente tem em torno de 60% a 70% do crescimento da forragem na época das chuvas, quando se tem água, luminosidade, calor e esses fatores favoráveis. E na hora que chega o período da seca, a gente tem além de redução de disponibilidade de água, também da luminosidade e temperatura. Então se fecha o ciclo em que eu tenho bastante oferta na época das águas e na época da seca eu tenho limitação de disponibilidade de forragem e de qualidade de forragem também. Na hora que chega no final do período das chuvas, as forragens dão semente, elas sementeiam […] e com isso cai sua qualidade. Então normalmente a maior preocupação do pecuarista e dos técnicos é com a perda de qualidade. A gente tem uma perda temporária de qualidade no período seco”, analisou.
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O veterinário lembrou que em 2021 o desafio deve ser ainda maior por conta de uma seca ainda mais severa que a de 2020 sobre o Brasil Central. “Mas esse ano principalmente aqui no Brasil Central a gente vai ter um agravante a mais. Como praticamente não choveu nada em abril e maio, nós vamos ter uma limitação também de disponibilidade (além de qualidade), então a coisa fica mais complicada. Então esse ano é um ano que precisa de muita atenção”, alertou Castro.
O doutor em ciência animal e pastagens explicou como o produtor pode ficar com um prejuízo de até R$ 400,00 por cabeça se continuar fornecendo o suplemento da época das águas na seca. “Na prática, no período da seca, […] com essa perda de qualidade em que o teor de proteína bruta da pastagem cai de 7%, que é o nível que os microorganismos ruminais precisam para fazer a digestão da fibra dessa macega do pasto seco, a tendência é que o animal tenha perda de peso. Então ele vai perder entre 150 a 200 g por dia. […] Vamos usar o exemplo do Brasil Central – em 180 dias perdendo em torno de 200 gramas, o animal vai perder uma arroba. […] Ou seja, se durante esse período eu não fizer nada, eu continuar a tratar o animal com o mesmo tipo de suplemento que eu uso no período das águas, no caso de quem trabalha com suplementação de linha branca, de sal mineral, você vai perder uma arroba por cabeça. E é uma arroba de animal de recria, o que custa em torno de R$ 400,00”, calculou.
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Flávio, entretanto, listou quais são as variações nas estratégias de suplementação, que têm um ponto em comum entre si: todas dependem de uma condição mínima de pastagem. “A gente tem várias estratégias. A primeira coisa que teria que ser pensada e às vezes até se ele não foi feito ele se complica um pouco era uma veda. Ele deveria ter vedado o pasto para ter pastagem disponível para ser usada na seca, que é o que a gente chama de feno em pé, que é uma tecnologia muito usada no Brasil Central. A partir do momento que eu tenho essa forragem disponível, aí a gente vai entrar com as técnicas de suplementação e a gente fala até suplemento porque a gente vai fornecer uma parte do que o animal ingere”, prosseguiu o especialista.
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Na sequência, Castro detalhou cada uma das suplementações indicadas para a seca. “A suplementação mais básica que existe, o primeiro suplemento que entraria, seria o sal mineral para não ter perda de peso. Aí depois você poderia usar um sal com ureia, muito utilizado para matrizes para mantença de peso. E aí a gente entra com os proteicos e os proteicos energéticos. O proteico visa corrigir principalmente essa deficiência de compostos nitrogenados, a deficiência de proteína bruta, trazer para os 7% aquilo que estava em 3% a 4%. Com isso a gente ativa, ou a gente turbina o rúmen por meio dos microorganismos ruminais e o animal vai aumentar o consumo dessa forragem seca, dessa macega. Assim, o animal que estava perdendo peso volta a ganhar peso. Normalmente os suplementos proteicos são de consumo baixo, de 0,1 a 0,15% do peso vivo, e o ganho de peso vai ser semelhante. Só que o proteico vai produzir uma arroba barata, gastando em torno de R$ 120,00 a R$ 150,00 de suplemento por animal em 180 dias. Se o seu pasto estiver bom, tiver qualidade e disponibilidade, você vai conseguir fazer um arroba ao invés de perder um arroba com esse custo em torno de R$ 150,00. Aí depois a gente tem o proteico energético, em que, além de proteína, vai fornecer energia também, fornecer amido, ou seja, vou fornecer algum grão ou algum resíduo que tenha energia. Quando se usa o energético, […] eu vou fornecer mais quantidade, normalmente entre 0,25% a 0,5% de peso vivo, mas o ganho vai ser maior, entre 0,3% a 0,5% do peso vivo e ele também é interessante quando as condições de pasto estão piores. Quando eu tenho menos qualidade de pasto, é quando eu entro com suplemento com maior oferta”, apresentou o doutor em ciência animal e pastagens.
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Segundo Castro, as estratégias de suplementação são contempladas ainda em sistemas um pouco mais intensivos, como a recria intensiva a pasto (RIP) ou a terminação intensiva a pasto (TIP). “A gente pode até falar que as estratégias são focadas no energético porque enquanto a gente está falando de fornecer 0,1% de proteico ou 0,25%, a 0,3% de energético, numa TIP você vai para 1,5% a 2% do peso vivo. Em uma RIP você vai para 0,5% a 1%. Então eles estão mais próximos de um semiconfinamento. Você vai fornecer, sim, energia e proteína, mas em maior quantidade. Na suplementação convencional eu estou tentando melhorar o desempenho do animal, mas quando eu vou para TIP e para a RIP, além do desempenho do animal, a gente está pensando também no desempenho da área, na produção por área. E quando eu entro com mais suplemento, com mais alimento, eu acabo melhorando a lotação também”, especificou.
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O veterinário também resumiu o que pode fazer o produtor que não tem disponibilidade de pasto para poder pensar na suplementação. “Se não tiver pasto, tem que ir para o confinamento. Ou seja, a forragem é a base desse sistema. Nós estamos falando em fornecer 10%, 20% do que o animal come no cocho, O resto entra tudo via pasto. Então é fundamental ter disponibilidade de pasto, principalmente. E esse ano vai ser complicado porque vai ter problema de disponibilidade”, alertou.
Castro lamentou que parte dos produtores ainda não usem o pacote tecnológico que está à disposição da pecuária de corte. “A pecuária está um passo atrás da agricultura. Na agricultura, se a gente pegar um sojicultor, ele vai usar o pacote correto porque senão vai ter prejuízo. Na pecuária, muitos produtores já estão usando tecnologia da mesma forma que os agricultores, mas alguns ainda não adotam pacotes tecnológicos adequados”, advertiu.
Entretanto, o especialista reforçou que lançar mão de alguma dessas estratégias esse ano será imprescindível. “Esse ano vai ser essencial. Às vezes os produtores pode se assustar porque os produtos subiram muito de preço, já que as commodities subiram. Mas a gente tem que ver que o boi subiu muito também. Então na hora que você faz a conta da relação custo x benefício, ela não fica ruim, ela fica boa”, observou.
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Veja no vídeo a seguir a entrevista completa com o médico veterinário e doutor em ciência animal e pastagens Flávio Castro:
Foto: Reprodução / Embrapa