Em meio ao crescente sucesso da pecuária brasileira, uma preocupação emergente tem sido o aumento de casos de cisticercose, uma doença que pode causar grandes prejuízos aos produtores. Numa entrevista detalhada com o médico-veterinário Marcelo Molento, PhD em parasitologia, professor pela Universidade Federal do Paraná e consultor da FAO, discutimos as implicações da cisticercose na produção de carne bovina e medidas preventivas eficazes. Assista ao vídeo abaixo e confira os detalhes desta conversa.
De acordo com levantamentos realizados pelo Serviço de Inspeção Federal, entre 2010 e 2020, cerca de 6,5 milhões de carcaças de bovinos foram identificadas com cisticercose no Brasil, traduzindo-se num problema diário para cerca de 1.500 animais.
Os Estados do Sul do Brasil, seguidos por Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro, lideraram esses registros. Esses números não apenas apontam para uma questão de saúde animal, mas também indicam significativas perdas econômicas para o setor.
“O frigorífico não é culpado, em hipótese alguma. Ele não deseja fazer isso porque perde no valor da venda. Também é muito ruim para o nosso mercado porque o Brasil acaba sendo conhecido externamente como um mercado não comprador de carne saudável.”
Marcelo Molento
Compreendendo a cisticercose bovina
A cisticercose é uma infecção causada pela ingestão de ovos de Taenia saginata, resultante da contaminação do pasto ou da água por fezes humanas que contêm os ovos do parasita.
Na imagem acima, tem o detalhe de como é o ciclo da cisticercose: A1: Ingestão do cisticerco na carne bovina pelo homem, A2: parasito desenvagina no intestino delgado, A3: desenvolvimento da tênia adulta no intestino humano, A4: liberação de pedaços do corpo da tênia com centenas de milhares de ovos para o ambiente, B: presença de ovos na água, planta forrageira e outros alimentos para bovinos, C1: ingestão de ovos pelos bovinos, C2: liberação do parasito no intestino bovino e penetração até a circulação sanguínea, C3 e C4: desenvolvimento do cisticerco na carne e órgãos do bovino.
Este problema de saúde pública é intensificado pela falta de saneamento básico em áreas rurais, onde a prática de defecar ao ar livre é mais comum, e pela insuficiente fiscalização sanitária das fazendas e do processamento de carne.
Medidas preventivas contra a cisticercose
Dr. Molento enfatiza que a prevenção da cisticercose passa necessariamente por uma abordagem integrada que inclui:
- Educação sanitária: Conscientizar todos os trabalhadores da fazenda sobre a importância da higiene pessoal e do uso adequado de instalações sanitárias.
- Gestão de resíduos: Garantir que as fezes humanas sejam devidamente tratadas e não dispostas em áreas onde os animais possam ter acesso.
- Controle e monitoramento: Realizar exames regulares nos rebanhos e inspeções rigorosas na carne para detectar e isolar casos antes que os animais cheguem ao mercado.
- Tratamento veterinário: Implementar programas de desparasitação regular para controlar outros fatores que possam debilitar os animais e torná-los mais suscetíveis a infecções.
O papel da comunidade e das autoridades
Além das medidas no nível da fazenda, Dr. Molento salienta a necessidade de uma política de saúde pública mais robusta que envolva tanto as comunidades locais quanto as autoridades sanitárias.
A criação de infraestruturas de saneamento adequadas e o reforço da fiscalização são essenciais para prevenir a ocorrência e disseminação da cisticercose.
Um alerta para a pecuária nacional
O aumento dos casos de cisticercose no Brasil é um alerta para a pecuária nacional, indicando a necessidade urgente de abordagens preventivas mais estritas e coordenação efetiva entre produtores, autoridades sanitárias e a comunidade em geral.
Ao adotar práticas de manejo adequadas e investir em educação e infraestrutura de saúde, o setor pode proteger não apenas a saúde animal, mas também a integridade da cadeia produtiva da carne no Brasil.