Como os confinamentos estão transformando bovinos em “atletas de alta performance”?

Agrônomo compartilhou resultados da 5ª edição do Benchmarking Cargill de Confinamento e destacou principais mudanças na engorda intensiva no Brasil

Em entrevista ao Giro do Boi desta terça, 27, o engenheiro agrônomo Felipe Bortolotto, consultor técnico nacional de bovinos de corte da Cargill, compartilhou os resultados do 5º Benchmarking de Confinamento da companhia e explicou como os confinamentos estão aproveitando o ritmo de olimpíadas para transformar os bovinos, tanto machos como até as fêmeas de descarte, em verdadeiros “atletas de alta performance” no cocho a partir de uma série de ajustes dentro da fase de engorda intensiva.

“Eu acredito que nós estamos num processo evolutivo de mudança mesmo. Quando a gente começa a olhar para outros países que fazem a engorda intensiva há mais tempo, a gente vê a maturidade que a turma de fora tem e o que o Brasil está buscando. Uma coisa que é fato é que a gente está cada vez mais aumentando a permanência dos animais no cocho, ou seja, os animais vão sair para o abate mais pesados e isso faz com que várias técnicas dentro do dia a dia tenham que ser melhoradas. Você tem que ser melhor nas suas rotinas, melhor na leitura, porque você vai entender a permanência dos animais, melhor na ronda sanitária, tem que trabalhar sanidade de casco, sanidade ambiental, sombreamento… O que o brasileiro está realmente entendendo é que não é mais aquele tirinho curto de 60 dias, é o tiro de 120, 150 dias. Ele está entendendo que ele precisa processar grãos para melhorar absorção do alimento que ele está dando para os animais, ele aprendeu que ele precisa apartar melhor o gado, formar lotes mais homogêneos. Então é um processo de muitos fatores”, resumiu Bortolotto.

O especialista comentou como os confinadores estão buscando alternativas para melhorar o aproveitamento da dieta oferecida. “O que a gente tem visto é realmente uma adoção cada vez maior no processamento dos grãos. São técnicas desde a silagem de grão úmido, snaplage, buscando até grão úmido de sorgo, fazendo uma melhor moagem do grão seco. […] Outra coisa que a gente tem visto realmente é uma utilização estratégica dos coprodutos. Hoje tem DDG de milho chegando, tem vários outros coprodutos da soja, como o melaço de soja, enfim, os produtores têm trabalhado estrategicamente melhor os ingredientes, têm processado mais os grãos e a gente tem visto o nível de energia aumentando a cada ano. A gente viu que o animal no cocho, já que nós estamos no período de olimpíadas, tem que ser um ‘atleta de alta performance’. Então não dá para pôr o animal no cocho e querer tratar com uma dieta bamba. Ele tem que entrar lá e ser bom de conversão. Hoje a gente já tem dieta sem nada de volumoso porque, às vezes, sua estrutura não permite a produção de volumoso e a gente consegue formular uma dieta sem volumoso”, exemplificou.

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O consultor destacou também os avanços no manejo sanitário dos bovinos, cuja evolução ocorre não somente via protocolos, mas também por meio de ações paralelas. “Evoluímos muito (na sanidade). Isso fica nítido no nosso levantamento. Teve uma evolução desde protocolos de entrada, recebimento. Hoje em dia […] tem muita unidade com uma dieta de recepção, ou seja, esse animal chega e primeiro ele recebe uma comida de quem viajou mesmo, de quem está vindo de uma condição de seca ‘braba’, que veio de um transporte de cinco, seis, dez horas de caminhão. Então primeiro tem que ter uma recepção. Depois eu faço adaptação e depois eu chego na terminação. Então esses programas nutricionais melhoraram, melhorou o pacote sanitário, os protocolos sanitários de entrada, melhoraram também as tecnologias para esse animal viajado. Nós mesmos temos tecnologias […] tanto para transporte de animal, para repositor eletrolítico, tanto para chegada, para o animal que está estressado e precisa de uma carga mineral e vitamínica maior. Tudo isso hoje tem no mercado e a turma está usando”, lembrou o consultor da Cargill.

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Bortolotto detalhou o estudo que levou a tais observações sobre a evolução do confinamento de gado de corte no Brasil. “Foi a nossa 5ª edição do Benchmarking Cargill de Confinamento, então a gente já está com esse trabalho de cinco anos. […] Nesse ano de 2020, que são os dados que a gente analisou, foram 71 confinamentos, mais de 608 mil cabeças avaliadas, e foi o primeiro ano que a gente trouxe dados de fêmeas também para análise. A gente instituiu um comparativo dos 20% melhores confinamentos e conseguimos fazer uma análise econômica bem profunda. […] Como eles estão em relação a lucro, índices zootécnicos, produção de arrobas, em gestão de pessoas, tudo isso está no benchmarking. E depois eu consigo olhar (e comparar) na coluna dos top 20%. […] O que esse confinamento produz mais arrobas? Por que a conversão alimentar dele é melhor? Qual o perfil de dieta que ele tem? Então o nosso benchmarking desse ano trouxe novas informações […] Foi assim que a gente se preparou para esse ano de 2021”, contou.

O consultor justificou a importância de um estudo de benchmarking relativo aos confinamentos de gado de corte no Brasil. “Não tem como a gente se planejar para frente se eu não entender como foi o passado e realmente traçar as tomadas de decisões para melhorar no futuro. A gente brinca que a gente quer ter erros inéditos. Errar coisa que você já está errando na pecuária faz tempo não dá mais!”, brincou. “E lembrar que o patamar que chegou a pecuária, no valor do ativo que está a arroba, nos preços dos alimentos, não dá mais para você tomar decisões no escuro. Então o benchmarking, uma comparação, você pode olhar na sua região para produtores do seu tamanho ou para produtores que estão fazendo melhor do que você e se perguntar: por que aquele produtor foi melhor do que eu? O que ele está fazendo? Então hoje em dia a gente tem que comparar”, sustentou.

Antes de intensificar a produção, intensifique a gestão

Entre as tendências apontadas no levantamento está a entrada de um animal mais leve para o recebimento da dieta intensiva. “A gente entende que é uma tendência. Embora no benchmarking tenha sido registrado o mesmo peso de entrada de um ano para o outro (2020 para 2021), a gente acredita que esse peso de entrada vai diminuir ao longo do tempo, ou seja, a gente vai entrar com animais de eras mais novas, animais um pouco mais leves porque eles são mais novos e a permanência em cocho vai aumentar. A gente vê que a permanência aumentou, mas o peso de entrada continua. Hoje o peso médio de entrada, no levantamento, foi de 390 kg, mas a gente acredita que este indicador vai ser reduzido a 360 kg e vai chegar a até 340 kg nos próximos cincos anos”, projetou.

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Conforme apontou Bortolotto, a terminação de fêmeas em confinamento, novidade do 5º benchmarking, também tem uma tendência de crescimento. “Realmente é uma realidade, principalmente para os programas de carne de qualidade, e também porque a turma da reprodução não tem mais permitido a chance para esses animais. Então está aparecendo muitas fêmeas jovens que participaram de um programa de precocinhas, que foram desafiadas, ficaram vazias e que vão ser terminadas em cocho com qualidade de carne excepcional. A fêmea tem um desempenho um pouco menor do que os machos, porém nos nossos dados ficou bem nítido que o confinamento de fêmea bem tocado pode ser comparado ao de macho”, constatou.

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TRIPÉ PARA O SUCESSO

Bortolotto frisou quais são os três principais diferenciais da turma que compõe os top 20% entre os confinadores do benchmarking. “O que dá para ver é que é uma turma muito boa de compra de insumos, ou seja, tem capacidade de estocagem, faz bons contratos, compra na hora certa e isso permite ter uma dieta competitiva o ano todo. Essa é uma ótima dica e a gente tem levantado essa bandeira. Outro ponto é a turma que processa grão muito bem feito. Então é a turma que usa grão úmido, vai colher um snaplage, vai fazer estrutura não só do milho ou do sorgo triturado, vai fazer um negocinho a mais ali para o animal comer. São duas coisas que essa turma dos top 20% fazem muito bem. E o terceiro ponto que eu citaria é a equipe, a rotina, a gestão, o dia a dia, pessoas. A gente vê que os top 20% têm um time querendo fazer a produção de carne bem competitiva. Eu colocaria esse tripé: a compra de comida, o processamento de grãos e a equipe de rotina. Porque confinamento é rotina, é todo dia do mesmo jeito, sábado e domingo”, observou.

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O consultor da Cargill compartilhou a projeção da companhia para o volume de gado confinado em 2021 depois de um começo de primeiro giro relativamente lento. “A gente acredita realmente que haverá um crescimento no mercado. A gente não tem números oficiais, tem a nossa conversa do dia a dia no campo, do que a gente observa, como aumento de linhas de clientes para aumentar capacidade estática do confinamento, a gente percebe boiteis com uma demanda muito grande, e a seca acelera isso. As águas já vieram com pouca chuva e isso também aumentou muito a demanda pelo cocho. Então a gente acredita que vai haver um crescimento em relação ao número de animais confinados do ano passado para esse ano de 2021. Ainda é muito cedo para falar em números, mas eu acredito que nós vamos confinar mais do que confinamos no ano passado”, confirmou. A estimativa é que em 2021 o País possa até ultrapassar a marca das sete milhões de cabeças terminadas em cocho.

Como último recado, Bortolotto reforçou a importância da celeridade na tomada de decisão dentro da pecuária intensiva. “Uma dica que eu poderia falar é que você não pode deixar o pasto esturricar para você ver que está com a capacidade de suporte baixa na fazenda e o gado começou a escorrer. Demorou, errou. Esse é um ponto que eu destacaria: tomar atitude mais rápido, se cercar de bons profissionais de empresa parceiras para poder tomar essa atitude rápido e outro ponto eu comentei dos erros inéditos”, concluiu.

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Pelo vídeo a seguir é possível assistir a entrevista completa com o engenheiro agrônomo Felipe Bortolotto, consultor técnico nacional de bovinos de corte da Cargill: