“Apetite chinês” será componente importante para projetar mercado de carnes no 2º semestre

Redução da produção de carnes na China por conta da peste suína deve continuar impactando a demanda; recuperação de preços do petróleo é positiva para o Brasil

A segunda metade de 2020 teve pontapé inicial nesta quarta-feira, dia 1º de julho, e projetar o comportamento dos mercados que envolvem diversas cadeias produtivas é um exercício complexo. Em entrevista ao Giro do Boi, o chefe da mesa de commodities e gestor de risco Marco Sampaio, que atua na JBS em Greeley, estado do Colorado, nos Estados Unidos, falou sobre o assunto e pediu atenção com os fundamentos do mercado para os que estão tentando fazer estimativas o mais próximo da realidade o possível.

“Eu espero que (o segundo semestre) seja menos volátil que este primeiro semestre. […] Eu acho que os fundamentos vão voltar a prevalecer, eu acho que as pessoas vão voltar aos mercados, olhar oferta, olhar demanda, olhar de novo o mercado chinês em termos de demanda para carne, olhar o mercado de grãos dentro dos Estados Unidos para ver como vai ser a safra. Eu acho que as coisas vão se normalizar, vai ter menos volatilidade e, se Deus quiser, a gente vai conseguir operar num ambiente mais estável, que seja benéfico para todo mundo”, estimou.

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O especialista apontou que o déficit de proteínas dentro da China provocado pela redução da produção em decorrência da peste suína deve continuar impactando a demanda mundial por carnes. “O apetite chinês com certeza vai continuar sendo um driver muito importante desse mercado e algo que vai manter os preços e de certo modo firmes, principalmente das carnes”, disse. Sampaio afirmou ainda que a recuperação do preço do petróleo fortalece outras economias mundo afora, o que pode ser bom para países produtores de carne, como o Brasil, por conta de um reforço na demanda.

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Sampaio deu dicas aos operadores que buscam acompanhar o mercado sem interferências de notícias de fontes duvidosas. “Ficou até um excesso de informação (em meio à pandemia), então eu tenho tentado hoje, na realidade, ser muito mais seletivo com aquilo que leio porque você não pode acreditar em qualquer tweet que você lê, em qualquer pessoa que se diz especialista falando no YouTube. Tem muita gente operando só com base nas manchetes e tentando mover mercados desta maneira. Então o que eu tenho feito é tentar ser muito mais fundamentalista, olhar muito mais nos detalhes pra poder entender porque estas pessoas, que se julgam especialistas, muitas vezes não sabem de nada ou não tem experiência que a gente tem. Desta maneira, o meu conselho é: seja amigo da tecnologia, mas filtre aquilo que te traga informação melhor e de longo prazo. Uma manchete hoje aqui e ali não vai mudar mercado a longo prazo. O importante é você entender os fundamentos e como isso vai mudar o mercado em longo prazo porque é assim que você vai realmente ganhar dinheiro”, indicou.

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Como exemplo de informação a ser analisada de olho nestes fundamentos de mercado, Sampaio comentou pesquisa encomendada pela NCBA, em tradução livre, a Associação Nacional dos Produtores de Carne Bovina, que apontou que a pecuária dos EUA terá prejuízo superior a US$ 13,5 bilhões por conta da pandemia. “Essa é uma notícia, de novo, que a gente tem que olhar com cuidado. Se você olhar num ponto do tempo e falar que causou US$ 13 bi de dólares de prejuízo, sim, isso pode ser verdade se você comparar o mercado da semana anterior com o mínimo daquela semana, Mas, de novo, é a necessidade de a gente entender a informação a fundo, tentar olhar realmente o que está acontecendo. Neste caso específico, a gente não sabe quanto de hedge tinham os produtores. Se o produtor tinha 100% de hedge, o prejuízo dele foi zero porque tudo que ele perdeu no mercado físico pela queda do boi, ele ganhou nos futuros. E além do mais, o diferencial de base abriu muito porque os futuros começaram a operar a um desconto grande sobre o mercado físico […]. Então é muito importante a gente entender o mercado como um todo. Se você tirar uma foto do mercado naquele dia e falar assim do pico da alta para a mínima, você vai dizer ‘poxa, a queda foi fantástica, nunca se viu uma coisa assim’. Só que na verdade a gente não tem como quantificar isso se a gente não entender especificamente a situação de cada um. A gente não sabe o quanto o produtor estava hedgeado, a gente não sabe qual risco de base ele tinha feito, se ele tinha feito contratos a termo, então tudo isso é importante entender antes que se tome uma decisão ou que se crie uma notícia ou uma manchete nova”, ponderou.

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Sampaio concluiu com recomendações ao pecuarista que precisa tomar decisões neste momento. “Continuar focado naquilo que você pode controlar, na sua produtividade, na qualidade do seu rebanho, na qualidade da sua carne que você está produzindo, no seu gerenciamento de risco, nos seus insumos, principalmente na qualidade do seu pessoal, das pessoas que te rodeiam. Em momentos assim, acho que não tem nenhuma opção senão lutar e vencer. Então restar rodeado de pessoas boas e pessoas inteligentes e determinadas é muito importante”, finalizou.

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Veja a entrevista completa com Marcio Sampaio ao quadro Giro pelo Mundo no vídeo a seguir:

Foto: Reprodução / Mapa