Em um período de dez anos, o pecuarista de corte brasileiro já investiu R$ 13 bilhões somente no que diz respeito a aumento de produtividade. E embora os resultados já sejam expressivos, há uma tendência de continuidade desse cenário. Foi o que adiantou ao Giro do Boi em entrevista nesta quinta-feira, dia 15, o engenheiro agrônomo esalqueano Maurício Palma Nogueira, coordenador do Rally da Pecuária e diretor da consultoria Athenagro.
O agrônomo iniciou sua entrevista reconhecendo o trabalho dos produtores pelo Dia Nacional do Pecuarista. “Se a gente comparar a produtividade da pecuária na década de 90 com a de hoje e fazer um balanço da produção de carne de agora com a dos anos 90, o ganho tecnológico possibilitou que a gente poupasse de 250 a 260 milhões de hectares, que teriam que ser desmatados se a gente quisesse produzir a quantidade de carne de hoje com a tecnologia da década de 90. Um dia o pecuarista vai ser reconhecido por esse feito”, estimou o consultor.
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Maurício respondeu, então, se o pecuarista vive de fato um grande momento por conta da valorização de seus produtos. “Não diria que ele vive dias melhores. Você tem um preço muito favorável, pois a cotação da arroba subiu, mas não ficou mais fácil. Os custos também subiram, então as margens seguem dentro do patamar histórico que a gente vinha vindo. As margens antes eram muito elevadas, então era mais fácil você operar, você tinha uma situação tranquila. Hoje em dia, embora a atividade permita oportunidades melhores para o produtor, ela é muito mais difícil de ser conduzida”, ponderou.
“Por muito tempo o pecuarista ainda foi melhorando a propriedade ele, foi implementando tecnologias e conviveu com um período muito ruim, que era o momento em que o gado em estoque, aquele rebanho enorme que a gente tinha, era acima do mercado. O rebanho ainda é enorme, mas a gente tinha um rebanho muito acima da demanda. À medida que a gente vem ajustando tudo isso de acordo com a demanda, que o rebanho caiu e a demanda foi aumentando, essas margens foram recuando. Naquele período, era muito difícil você obter resultado mesmo usando tecnologia. Você fazia tudo certinho, só que tinha tanto produto no mercado que os preços vinham numa faixa abaixo dos custos de produção. Então hoje a gente está vivendo já esse momento que a situação está equilibrada. A gente acredita que isso aconteceu a partir de 2009, 2010, e nós estamos num momento que há um estímulo à implementação tecnológica, ao crescimento e à gestão bem feita da propriedade”, analisou.
O especialista compartilhou informações que compilou em artigo recentemente publicado pelo site rallydapecuaria.com.br (acesse pelo link abaixo), onde projeta resultados melhores para a pecuária em 2021 na comparação com os obtidos em 2020. Mas isso é longe de ser uma tarefa fácil.
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“Os custos de produção subiram muito mais, mesmo nas propriedades de alta tecnologia. […] Aliás, é sempre bom reforçar isso: quando a gente aplica tecnologia o objetivo não é redução de custo, é aumentar o faturamento. Claro que você não pode desperdiçar e operar num custo mais alto do que se deve, mas você não está trabalhando focando em reduzir custos, você quer aumentar o faturamento e ganhar na diferença. O que interessa para a gente é a diferença entre receita e faturamento. Então se a gente pegar hoje a pecuária de baixa tecnologia, […] ela teve aumentou de custo em torno de R$ 50 a R$ 380,00 por hectare, o que equivale a 10% a 20%. Na pecuária alta tecnologia, o aumento de custo de 2020 para 2021, considerando as projeções desse momento até o final do ano, é de R$ 980 a até R$ 2.000,00 por hectare a mais que o produtor tem que colocar para produzir, o que representa de 26% a 30%. Então o custo da pecuária de alta tecnologia aumentou muito mais porque ela é dependente de moléculas cotadas em dólar. O dólar subiu […], a alta tecnologia é também dependente dos grãos, e provavelmente com essa safra difícil pelas geadas, com todas as previsões de safra e entressafra e toda a recuperação econômica global demandando mais proteína, nós provavelmente vamos ter ainda um aumento nos custos ou pelo menos trabalhar em patamares mais altos do que a gente esperava no mercado de grãos” ponderou Nogueira.
Mas ao mesmo tempo que houve aumento dos custos para todos os perfis de produtores, os que utilizam alta tecnologia ou não, o faturamento também aumentou. “A pecuária de baixa tecnologia aumentou o seu resultado de 70% a 140% e a de alta tecnologia, de 50% a 60%. Então ainda vai ter margem na alta tecnologia. E a gente também chama atenção para uma análise: muita gente está comparando o mercado de pecuária com o mercado de grãos ou outros mercados e falando que a margem caiu. As relações de troca com os principais insumos caíram mesmo, pioraram, para o produtor, só que o custo de produção não é formado 100% por grãos. […] Quando você trabalha todo o balanço, a gente ainda projeta aumento de margem para esse ano”, anunciou.
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O agrônomo revelou o que representa o aumento de faturamento em números absolutos. “Esses 70% a 140% de aumento de resultado na pecuária de baixa tecnologia representa um lucro melhor por hectare, assumindo que a propriedade foi administrada da mesma proporção que em 2020, de R$ 230,00 a R$ 800,00 por hectare. É isso que o produtor vai levar a mais com esse aumento de preços, com esse aumento de margens na fazenda. E a hora que a gente avalia os 50% a 60% só de aumento de resultado, ele representa um acréscimo de R$ 1.500,00 a R$ 3.400,00 por hectare na alta tecnologia. Por isso que a gente sempre frisa, a gente sempre reforça a importância de você avaliar toda a estrutura, toda a composição de custos e faturamentos da fazenda antes de avaliar a viabilidade ou decidir por fazer tecnologia. E você lembrou bem: se eu estou usando muita tecnologia e a fazenda é mais difícil de administrar, eu sou muito mais exigido do ponto de vista estratégico, gerencial e operacional da minha propriedade. A margem para erro na alta tecnologia é muito pequena. Então, às vezes, a gente tem muito caso de frustrações com aplicação de tecnologia, mas é porque, na verdade, a compra dos insumos e do pacote tecnológico não foram acompanhados de uma evolução gerencial, que devia ter sido adaptada a essa nova realidade da fazenda. Então o produtor tem que ter todo cuidado na hora de decidir”, recomendou.
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O consultor indicou o que deve pesar na hora de o pecuarista tomar a decisão por investir no pacote tecnológico a ser utilizado dentro de sua porteira. “É equilibrar a administração com o pacote tecnológico. Você não pode colocar em escala a sua fazenda e deixar algum ponto ineficiente. Vou dar um exemplo básico. Imagine que eu melhoro toda a produção, toda a capacidade de suporte, toda a nutrição da minha fazenda, mas mantenho uma reprodução aquém do que deveria ter, um desempenho da produção de bezerros aquém do que poderia. Você vai elevar a quantidade de vacas vazias na sua propriedade que não são vendidas ao final do ano, então na verdade você vai colocar uma ineficiência em escala. Então você tem que ter totalmente o conjunto dos indicadores adequados para cada nível de tecnologia para não errar. E isso acontece em qualquer atividade”, observou.
Nogueira antecipou ainda parte de um levantamento que será divulgado brevemente pela Athenagro que aponta que o cenário para investimentos em aumento de produtividade na pecuária deverá seguir favorável para o produtor. “A pecuária investiu em aumento do pacote tecnológico de 2011 a 2020 cerca de R$ 13 bilhões, isso de investimento médio do pecuarista só em aumento de produtividade. Não é ao todo. […] O mercado pede que até 2025 que o pecuarista faça o dobro desse número, e isso na pior das hipóteses. Quer dizer, no cenário mais conservador, em cinco anos a gente teria que investir por ano o dobro do que foi investido por ano em aumento de tecnologia nos últimos dez anos. O que está implícito nessa informação? Se nada acontecer, algum evento de ordem macroeconômica ou de ordem sanitária, a tendência é que o mercado continue estimulando o aporte tecnológico até no mínimo 2025. Quer dizer que fica favorável para o pecuarista acelerar esse pacote. Esse é o recado básico. A gente tem um timing muito favorável, mas não vai ser fácil. Ele é favorável, mas ele tem que ser acompanhado de uma gestão extremamente rigorosa”, interpretou Nogueira.
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O agrônomo também opinou sobre o cenário para a pecuária de corte no segundo semestre de 2021 e para 2022. “Eu acho que os resultados continuam, se mantêm. O cenário é favorável, a demanda também. Nós temos algumas confusões nas análises que estão sendo feitas em relação às exportações, mas é um ajuste global sobre quem compra carne de quem, então vão mudando os players e isso pode criar um certo desconforto. Mas eu acredito que o mercado continue favorável até o final do ano. Acredito que em 2022 a gente tenha um ano parecido com esse ano. A atenção que nós vamos ter é com o mercado de grãos, com riscos climáticos. Vamos passar de novo por um ano seco, a pecuária já começou a ser castigada. […] Então a gente tem que ficar atento nesse momento a todas essas pressões e todo o componente climático que vai envolver a precificação de alimentos para 2022, mas eu acredito no mercado ainda favorável de proteína, tanto no segundo semestre de 2021 como para 2022”, declarou.
Pelo vídeo a seguir é possível assistir na íntegra a entrevista com Maurício Palma Nogueira, da Athenagro: