Se a maior parte das vacas do seu plantel de cria precisam ser assistidas no momento do parto para que os bezerros nasçam sem problemas, então algo não está certo com a genética que você está usando no seu rebanho. Foi um dos alertas que fez em entrevista concedida ao Giro do Boi nesta quinta, dia 22, o médico veterinário Marcelo Almeida, mestre em produção animal e gerente executivo da Cia de Melhoramento.
“Nós conhecemos algumas fazendas que dedicam 80% de assistência ao parto, ou seja, 80% dos bezerros que nascem precisam ser auxiliados porque não têm vigor ou porque o tamanho do teto não é correspondente, ou seja, necessitam de uma participação humana muito forte. E isso não está certo. Se nós estamos nessa realidade, está claro que nós precisamos mudar essa genética urgentemente porque a pecuária de corte não se sustenta com tamanha intervenção humana”, ressaltou o especialista.
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“Se a gente olhar para a raça Nelore, por exemplo, um dos grandes fatores que viabilizaram o seu desenvolvimento no Centro-Oeste, o crescimento da raça como tal, foi justamente essa viabilidade ao nascimento, esse vigor do bezerro. O Nelore é a segunda raça que mais rápido fica de pé e começa a mamar entre todas as raças criadas no Brasil. Veja só como a gente não pode errar no parto, e aquilo que é fácil de ser selecionado através do vigor desse bezerro, através do peso ao nascimento para que nós não tenhamos problemas de partos distócicos, partos com morte de bezerros, partos com mortes de novilhas”, destacou.
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E esta facilidade de parto, segundo Almeida, será uma característica cada vez mais relevante para as fazendas de cria. Ele justificou o motivo. “Porque cada vez mais nós estamos diminuindo a idade ao primeiro parto. A pecuária não consegue mais financiar uma novilha que chega ao primeiro parto com os seus 40 meses, 48 meses. Isso não existe mais! Nós precisamos cada vez mais baixar a idade ao primeiro parto, ser competitivos com o nosso rebanho Nelore tal qual como uma novilha meio-sangue, ou seja, a precocidade sexual é o novo capítulo fortíssimo dentro da realidade pecuária e nós temos que ter genética para acompanhar essa tendência através de touros que venham a produzir bezerros de baixo peso ao nascimento, portanto facilitando todo o processo de parto. Agora devemos ter baixo peso ao nascimento sem perder o vigor, a vitalidade do bezerro para que ele se ponha em pé o mais rápido possível, possa mamar rapidamente e acompanhar a matriz para qualquer condição que ela venha a enfrentar”, ponderou.
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A partir desta projeção, a própria Cia de Melhoramento já incorporou a característica não somente como uma informação, mas como parte da equação de seu índice de avaliação da bateria de touros. “Hoje os touros produzidos pela Cia de Melhoramento e por outros programas de melhoramento já têm essas informações de peso ao nascimento. O Índice Cia Genômico é o primeiro da pecuária nacional que contempla a característica de peso ao nascimento na sua ponderação, ou seja, nós acreditamos tanto que nós vamos precisar de vigor, de bezerros de bom peso ao nascimento na pecuária do futuro que nós já colocamos essa característica no nosso índice hoje. Ou seja, acreditamos que a pecuária não vai entourar mais novilhas aos 24 meses no futuro. Nós vamos entourar aos 18 ou aos 14 meses, tamanha a nossa convicção na precocidade sexual e no potencial genético dessa raça para encurtar ciclos e aumentar resultados. Nós estamos na era da velocidade a velocidade inclui necessariamente a precocidade sexual na atividade de cria”, comentou o veterinário.
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Mas de nada adianta a seleção genética para determinada característica, como precocidade sexual e peso ideal ao nascimento se o destino não for produzir carne – e carne de qualidade, conforme salientou Marcelo. “Para nós, a atividade de genética não está dissociada da realidade de produção de carne, ou seja, só pode ser uma boa fazenda de genética aquele que é especialista na produção de carne. Então primeiro nós temos que ser bons produtores para que a nossa genética tenha o mérito de ser compartilhada com as demais, seja na produção de touros ou na produção de touros que vão ser doadores de sêmen e vão ocupar espaço no mercado da inseminação no Brasil”, sustentou.
Por isso, outra característica que ganha relevância dentro da bateria de touros produzidos por meio da Cia de Melhoramento é o índice frigorífico. “Eu vou contar uma historinha rápida: há dez anos nós decidimos entrar num projeto de qualidade de carne e só esse ano nós conseguimos viabilizar os marcadores moleculares para lançarmos o índice frigorífico ao mercado. Já temos índices que já trabalham objetivamente com peso de carcaça quente, rendimento de carcaça, área de olho de lombo, cobertura de gordura, ainda maciez de carne. Cada uma dessas características tem herdabilidades distintas. Agora é importante a gente falar que a acurácia média dessas características está na ordem de 0,40 a 0,45, que eram as acurácias que a gente trabalhava com touros jovens antes da genômica. Ou seja, hoje nós temos condição de fazer uma seleção voltada para a função frigorífica de maneira objetiva com a mesma acurácia que nós fazíamos no passado quando trabalhávamos só com ganho de peso, com qualidade de carcaça, com precocidade sexual, ou seja, as ferramentas estão aí colocadas”, revelou.
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“Aquilo que nós vislumbramos lá atrás, há dez anos de trabalho e pesquisa junto com a Unesp de Jaboticabal, hoje é uma realidade e já aplicada a todos os touros que vão participar do Sumário Aliança, por exemplo, que já terão o índice frigorífico calculado. Os touros publicados no Sumário da Cia de Melhoramento também já terão índice frigorífico calculado. Nosso sumário vai ser lançado no dia 12/08 durante a reunião anual da Cia de Melhoramento que vai ser feita de maneira remota esse ano, infelizmente, mas com mais segurança. […] O nosso site vai disponibilizar também o sumário eletrônico para que todos possam acessar essa informação e tomar as melhores decisões possíveis. Então hoje a pecuária tem uma série de informações técnicas que podem mudar, sim, o seu panorama de produção. Basta que a gente utilize as informações dos sumários de touros. Os sumários são cada vez mais importantes porque eles são a atualização da genética, aquilo que aconteceu de novo no último ano e que nós trazemos todos os anos ao mercado para que o mercado faça um bom uso dessa informação e, dessa forma, possa mudar a realidade da pecuária nacional”, enalteceu.
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Mais do que eficiência do sistema produtivo que reflete em renda ao pecuarista, a produtividade que é viabilizada pela evolução genética atende o consumidor final no que diz respeito a sustentabilidade da cadeia. “Nós precisamos ter um rebanho mais eficiente porque os mercados são cada vez mais exigentes, não só exigentes do ponto de vista de qualidade, mas também do ponto de vista de sustentabilidade e respeito às condições ambientais. Nós temos que trabalhar com animais cada vez mais eficientes para que se justifique a ocupação da área, para que nós possamos fazer o melhor uso possível dos recursos ambientais e transformar essa energia toda que nós temos nos trópicos, que é a luminosidade, a pluviosidade em proteína nobre, em proteína de qualidade para atender ao consumidor, não só o consumidor nacional, mas o consumidor mundial”, declarou o veterinário.
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Mas combinar todas as características necessárias para corrigir e/ou melhorar um plantel já de qualidade não é tarefa simples e requer planejamento antecipado, conforme lembrou o gerente executivo da Cia de Melhoramento.
“Para o pecuarista profissional, a determinação do que se vai utilizar nessa estação de monta, na próxima estação de monta, já começou no ano passado, ou seja, com a revisão dos seus índices produtivos para identificação de pontos de melhoria, onde ele deve trabalhar, o que ele deve aportar de genética para corrigir determinadas características de suas matrizes para que então a gente possa, com a genética, melhorar a eficiência das nossas matrizes e assim ter um melhor resultado econômico da atividade. Para quem não sabe para onde vai, qualquer caminho serve. Mas não é isso que a pecuária moderna exige. Nós precisamos saber claramente o que nós queremos dos nossos rebanhos, onde nós queremos chegar com essas matrizes, e a genética tem um papel fundamental dentro desse processo. […] Hoje nós temos uma gama de indicadores de produção muito especializados, temos touros para habilidade materna, para precocidade sexual, temos touros para índice frigorífico, veja só que fenomenal, poder falar em rendimento de carcaça, poder falar em maciez de carne do Zebu, ou seja, coisas que há alguns anos seriam inimagináveis e hoje está à disposição do mercado com base, principalmente nos marcadores moleculares desenvolvidos pelos programas de melhoramento”, celebrou o veterinário.
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A entrevista completa com Marcelo Almeida, gerente executivo da Cia de Melhoramento, pode ser vista na íntegra pelo vídeo a seguir: