“Santa Gertrudis me pegou pelo bolso”, diz criador da raça no Nordeste

Pecuarista do sertão sergipano destacou alto desempenho da raça no cruzamento sem perder a rusticidade necessária para a produtividade em climas brasileiros

Eu digo que o Santa Gertrudis me pegou pelo bolso”, comentou em entrevista concedida ao Giro do Boi desta quarta, dia 09, o titular da Fazenda Mangabeira, criatório da raça desde 1978 em Japaratuba, no sertão sergipano, Gustavo Barretto da Cruz. O criador destacou o alto desempenho da raça nos cruzamentos, sem perder a importante característica da rusticidade, o que reforça sua versatilidade para o clima brasileiro.

Em sua participação no programa, Barretto lembrou que desde novo já percebia o potencial produtivo da raça. “Eu acompanho o meu pai desde cedo, o Santa Gertrudis chegou lá em casa antes de eu nascer. Eu não estava nem no projeto ainda. Eu sou de 1980 e o Santa Gertrudis chegou em 1978. Então antes do meu projeto, a raça já estava lá e eu nasci acompanhando isso. E a gente sempre teve o rebanho do Santa Gertrudis puro e a gente teve o rebanho de Zebu. E eu, ainda novo, gostava muito e comprava os animais. Quando eu botava na balança, o Santa Gertrudis sempre ganhava mais peso. Aí que eu digo que me pegou pelo bolso: toda vez que tinha o Santa Gertrudis lá eu dizia pro meu pai: ‘Eu quero os vermelhinhos! Mande para cá!’ E a gente comprava”, recordou o criador.

Gustavo lembrou do pontapé inicial da criação da raça na fazenda em Sergipe. “Meu pai era uma pessoa muito estudiosa, gostava muito de ler. E em 1978 ele viu que o Santa Gertrudis era uma raça que se encaixava perfeitamente para você fazer o cruzamento industrial a campo. Então ele veio a São Paulo, escolheu animais dos melhores planteis, levou para Sergipe e fez o nosso, começando em 1978. E em 1979 nasceu o primeiro animal. Desde lá, a gente está filiado à Associação Brasileira de Santa Gertrudis, há 41 anos”, detalhou.

Pioneiro na criação do Santa Gertrudis no SE afirma que raça tem bom desempenho na “pecuária da vida real”

O criador também explicou as origens da raça, que explicam sua adaptação ao Brasil. “É uma raça que foi criada lá no Texas, em 1910, justamente em um ambiente muito parecido com o Nordeste do Brasil. Eu tive uma oportunidade de visitar por duas vezes o King Ranch (berço da raça entre os municípios texanos de Corpus Christi e Brownsville, próximo a Kingsville). É uma fazenda que tem uma temperatura média de 37º C, 600 a 700 mm de índice pluviométrico anualmente. Então o Santa Gertrudis foi criado para isso”, salientou.

Para que os animais de fato expressem seu verdadeiro potencial, o sistema de produção na Fazenda Mangabeira contempla a realidade das propriedades brasileiras. “Nós criamos exclusivamente a campo, não tem essa questão de suplementação. É só sal mineral e sal proteinado quando necessário. Aí tem imagens de um lote dos animais que estão na prova de ganho de peso (disse, apontando para a tela). Nós estamos fazendo agora esse ano uma prova de ganho de peso a pasto junto com a Embrapa Geneplus, que acabou de ser concluída com resultados extraordinários, surpreendentes. É a primeira prova de ganho de peso que a gente faz com a Embrapa, antigamente a gente fazia com outros institutos de pesquisa e graças a Deus foi um sucesso absoluto”, celebrou Gustavo.

Rusticidade da raça viabiliza produtividade a campo.

O criador comentou a importância das provas de desempenho para a seleção genética da raça. “Nos últimos anos nós participamos de todas que tiveram, a gente já está com mais de seis provas. A dificuldade nossa, como a gente fica em Sergipe, é de trazer os animais. Mas a gente começou a vir trazendo os animais em 2016, 2017, em 2018 a gente fez o campeão da prova, em 2019 a gente fez o segundo colocado e em 2020 a gente ia trazer para a Embrapa em Campo Grande (MS), quando a pandemia impediu que ocorresse, e aí a gente fez a nossa prova lá. Essas imagens são de uma prova que acabou no dia 07/11 aqui em Buri (SP), uma prova da associação com 08 a 10 criadores. E dessa prova já teve animais contratados para central de inseminação, mostrando o crescimento da raça e a evolução. Aqui teve média em que o campeão macho apresentou 1,9 kg ao dia e a fêmea 1,65 kg ao dia”, informou Barretto.

Conforme apontou o criador, mesmo quando “longe dos holofotes“, os criadores da raça seguem fazendo o dever de casa para o melhoramento constante. “O Santa Gertrudis ficou um pouco fora dos holofotes e da mídia, mas a gente não parou o melhoramento genético. Já são cerca de 25 anos de melhoramento genético, antes balizado pelo professor Bento, muito querido pelo pessoal da associação, e agora a gente entrou no Geneplus. Estamos há mais de 12 anos no Geneplus Embrapa e o trabalho é justamente para isso, com melhoramento genético, internamente no Brasil, e trazendo material genético de fora”, revelou.

O pecuarista observou que buscar referências da raça em outras regiões do planeta traz resultados expressivos ao plantel brasileiro. “A gente trouxe (reprodutores) da Austrália, África do Sul e recentemente a gente trouxe, chegou há 30 dias, sêmen de três linhagens de reprodutores americanos, totalmente diferentes, linhagens completamente modernas, avaliadas por ultrassom de carcaça, genotipados, tudo top! E um deles inclusive foi vendido em um leilão nos Estados Unidos por US $130 mil, e a gente trouxe o sêmen dele para cá. É um novo Santa Gertrudis, um Santa Gertrudis dentro do que a pecuária brasileira precisa”, aprovou.

O trabalho sólido da associação dos criadores da raça tem atraído criadores, conforme avaliou Gustavo. “Esse ano entrou muito criador, mostrando a evolução da raça. Graças a Deus nosso mercado de tourinhos teve muitos parceiros, o estoque de reprodutores dos nossos criadores amigos acabou no primeiro semestre”, comemorou.

O selecionador ilustrou a contribuição do Santa Gertrudis no cruzamento industrial com o resultado do abate feito por um dos clientes da Fazenda Mangabeira. “Esse é um trabalho bem interessante. A gente acompanhou o nosso cliente lá desde o início, desde da concepção, aparte, trabalho que foi feito pós-desmama, o acompanhamento no confinamento. Foi interessante porque esses animais foram abatidos com 15,5 meses de idade, tiveram 58% de rendimento de carcaça e 20@ de peso médio. Isso aqui é a mostra do Santa Gertrudis moderno. Animais que dão uma heterose muito grande no cruzamento industrial e com alto ganho de peso”, destacou.

“E qual é o grande diferencial do Santa Gertrudis? Observe a questão da pelagem. Pelo zero, animais rústicos sem perder desempenho. Então você consegue fazer o tricross com alto desempenho e e rusticidade, que é o grande desafio do tricross hoje em dia, você ter um tricross com desempenho e rústico. […] Animais bem adaptados e que deram um rendimento muito bom para o pecuarista. É isso que a gente faz, a gente tenta estar o mais próximo que puder do pecuarista para ele ter resultado e acompanhar e estar junto com ele. Não é só vender o sêmen e não é só vender o touro, é acompanhar todo o processo para a gente ver realmente o que é que precisa melhorar. Todo mundo precisa melhorar. Tudo a gente pode dar um passo, tanto é que o melhoramento genético da gente, a gente não para e está sempre trabalhando”, sustentou Barretto.

Como funciona o cruzamento industrial rotacionado?

O criador também valorizou a qualidade da carne do Santa Gertrudis, que tem em sua formação uma raça britânica – foi sintetizado a partir de ⅝ de sangue europeu com Shorthorn e ⅜ de sangue zebuíno com Brahman. “Isso aí vem do Shorthorn. O Shorthorn tem uma qualidade de carne muito boa. Então o Santa Gertrudis tem habilidade materna, uma qualidade de carne e tudo vem do Shorthorn. E juntou com o Brahman e deu isso aí. Então aí é que vem essa qualidade de carne, a maciez, o sabor. O sabor da carne Santa Gertrudis é fantástico. O Santa Gertrudis, no Brasil, foi a primeira carne gourmet. Os restaurantes aqui de São Paulo, famosos, serviam carne Santa Gertrudis. Depois vieram outros”, frisou.

Qualidade da carne: uma das características do Santa Gertrudis que é herança do sangue Shorthorn.

A satisfação dos pecuaristas que usam a genética da raça serve como indicador para o sucesso do Santa Gertrudis no Brasil, conforme ressaltou Gustavo. “Eu recebi um dia desses um telefonema de um cliente lá da Bahia e ele virou para mim e disse: ‘Gustavo, eu abati agora filhos dos animais Santa Gertrudis e aconteceu uma coisa que nunca aconteceu na minha vida. O profissional para quem eu vendi, o marchante, me ligou agradecendo pelos animais que eu vendi para ele’. Isso é algo gratificante porque o meu produto eu faço para ele. O meu touro, que ele está usando, o meu produto, é justamente para isso. E a pessoa recebe uma ligação dessa de um cliente, não tem nada mais gratificante e que dá realmente coragem para a gente rodar 2 mil km atrás e trabalhar”, celebrou.

O futuro do criatório, conforme projetou o Barretto, passa por carregar o legado do pai e acompanhar os movimentos da associação avançando no melhoramento do Santa Gertrudis. “A cada dia trabalhar mais e cumprir o legado que ele deixou lá com a gente, a missão que ele deixou para a gente. Para 2021, tem vários projetos, dependendo de como vai desenrolar essa situação (pandemia). Mas a gente tem vários leilões para acontecer, teremos novas provas de avaliação de desempenho também, então vai ser um ano muito promissor para a raça. A gente está vendo outros trabalhos interessantes de avaliação de carcaça, de acompanhamento de abate justamente para a gente mostrar a cada dia mais a qualidade do Santa Gertrudis. Hoje nós temos sêmen em seis centrais de inseminação, então para qualquer sistema que o pecuarista tenha mais afinidade, ele tem material genético de ótima qualidade. Todos os touros nossos que estão nas centrais de inseminação, 100% são avaliados por ultrassom, são melhoradores genéticos, são campeões de prova. Então o criador, quando compra uma genética nossa, sabe que está comprando realmente uma genética de qualidade”, assegurou.

Animais de cria Santa Gertrudis na Fazenda Mangabeira, em Japaratuba-SE.

Para os criadores interessados em mais informações sobre a raça, o contato com a Associação Brasileira de Santa Gertrudis pode ser feito pelo e-mail santagertrudis@santagertrudis.com.br, pelo site www.santagertrudis.com.br ou ainda pelo telefone da associação que tem sede em Sorocaba-SP, o (15) 3347 8211.

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Assista a entrevista completa com Gustavo Barretto:

 

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