“Eu posso garantir para você: pode vir soja que não bate, não dá conta de ter o resultado, economicamente falando, igual ao que nós vamos ter nesses módulos que nós estamos rodando lá”, sustentou o zootecnista e professor da Universidade Estadual de Goiás Renato Dib, sobre o sistema de produção que idealizou e batizou de boi 22-22. Nesta quarta, dia 21, o profissional concedeu entrevista do Giro do Boi para falar do trabalho que está sendo validado junto à Agropecuária BSB, com propriedade localizada em Jussara-GO.
Conforme contou Renato em sua participação no programa, a ideia do sistema produtivo 22-22 surgiu a partir do trabalho com gado PO na Agropecuária BSB, propriedade de Elson Castilho e gerida pelo médico veterinário José Abel, para a qual Dib presta consultoria.
“Como a gente trabalhava com gado PO, desenvolvendo animais PO extremamente precoces e produtivos, a gente começou a pensar: ‘a ideia do gado PO é produção de carne. Nós temos que levar isso para o gado comercial. Por que não?’ Lá nós temos um trabalho de fêmeas superprecoces, emprenhando fêmeas aos 13 para 14 meses de idade e touros super jovens que aos 22 meses têm 650, 680 a 700 kg de peso vivo. Nós precisamos levar isso para o gado comercial. Essa é a ideia. E foi de onde surgiu, nós temos que levar esse rebanho produtivo e eficiente para o rebanho comercial”, relembrou Dib.
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De acordo com o consultor, o conceito 22-22 começou a ser trabalhado em 2017 “buscando essa eficiência para ter um animal jovem, com qualidade de carcaça, com 22 arrobas”. “E nada que seja fora de uma linha factível de produção”, frisou.
“Isso acontece quando a gente trabalha com intensificação. A redução da idade ao abate leva a maiores rentabilidades no processo produtivo. E nós estamos concorrendo hoje com soja, estamos concorrendo com cana-de-açúcar, com produção de etanol, então nós precisamos ser eficientes senão a gente vai ficar fora do mercado”, comentou.
TUDO COMEÇA NO VENTRE
Conforme explicou o zootecnista, a programação fetal desempenha papel fundamental na terminação do boi 22-22; “Quando você tem um ciclo longo, nós temos que ter grandes extensões de terra, nós temos que ter uma grande quantidade de estoque de gado. Então nós precisamos encurtar esse ciclo. Quando nós começamos a pensar nisso? Lá no início, na estação de monta, na fase de reprodução, aí sim a gente começa a estruturar o boi 22-22. Nós sabemos hoje que o processo de construção do nosso boi, o boi lá do frigorífico, no momento do abate, inicia-se no ventre da mãe. É o que nós chamamos de programação fetal. A partir desse momento. a gente começa a pensar nesse boi 22-22, um boi com uma maior quantidade de células musculares, uma maior quantidade de células adiposas para fazer uma carcaça que tenha qualidade”, esclareceu.
O tratamento diferenciado das mães dos bois 22-22 começa, conforme destacou o especialista em nutrição, no segundo mês da gestação. “Isso já inicia durante a gestação. A gente já trabalha a fêmea a partir do segundo mês de gestação. Elas são suplementadas visando fazer um animal que tenha estrutura de carcaça para poder ser explorada lá na ponta final (engorda)”, apontou.
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O zootecnista destacou também que parte importante do sucesso do boi 22-22 é o nascimento do bezerro do cedo. “Nós temos uma estação de monta curta de 90 dias. É o período ideal para a gente fazer ela, de novembro até o final de janeiro. A bezerrada vai nascer em agosto a novembro, lembrando que nós estamos buscando o bezerro do cedo. Essa bezerrada nasce até novembro e a gente faz uma desmama única para facilitar o manejo da fazenda. Normalmente em junho essa bezerrada é toda desmamada. Lembrando que nós estamos no Brasil Central, então junho é uma época que nós normalmente não temos qualidade nem quantidade de forragem, então esses animais vão para a recria intensiva, […] que eu prefiro chamar de resgate. Eu estou resgatando eles de uma situação não muito favorável, sem pasto, e eles vêm para uma condição de recria intensiva. Eles vão ficar em uma área restrita onde vão receber uma dieta com bastante volumoso, entre 65, 70 a até 75% do volumoso e, dependendo da qualidade do volumoso, completando com concentrado, simulando um pasto de boa qualidade para ele continuar estruturando carcaça”, detalhou.
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O criador do conceito 22-22 salientou ainda que, até este momento, o tratamento é o mesmo para machos que vão para a engorda e também para fêmeas de reposição. “Esse tratamento, até esse momento, é para machos e fêmeas. A fêmea, após o momento que ela sai da recria intensiva, do resgate, ela entra para ser desafiada para a reprodução, e depois ela volta para o pasto, normalmente como os outros animais, recebendo uma suplementação. Lembrando, são animais muito jovens que precisam ser alimentados adequadamente para continuar a curva de crescimento, senão eles estacionam”, avisou.
RECRIA ESTRATÉGICA
Depois de passar pelo resgate em recria intensiva, os animais que se tornarão os bois 22-22 são destinados à recria estratégica, conforme explicou Renato. “Essa bezerrada vai ficar na recria intensiva enquanto durar a seca, comendo alimento no cocho simulando pasto de boa qualidade, com ganho por volta de 700 gramas ao dia. Após iniciar a chuva, começando a sair pasto, ela retorna para o pasto para o que nós chamamos de recria estratégica, aí sim agora a pasto. Os bezerros recebem uma suplementação que vai de 0,3 a 0,5% do peso vivo, continuando a sua estruturação de carcaça e crescimento desse animal para que dali a 150 dias ele esteja apto para ir para a terminação”, acrescentou. O zootecnista informou que tanto o confinamento convencional quanto o confinamento a pasto podem servir de sistemas para a engorda.
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“PODE VIR SOJA QUE NÃO BATE”
Renato Dib respondeu se o sistema de produção custa caro e justificou revelando algumas das marcas alcançadas nas áreas em que o sistema está sendo validado na Agropecuária BSB, em Jussara-GO. “O que é caro e o que é barato? Na minha concepção, caro para mim é aquilo que não dá resultado e barato é aquilo em que eu sou eficiente. […] Nós estamos fazendo um sistema de TIP, terminação intensiva a pasto, e ontem a noite eu fechei o primeiro lote que nós estamos trabalhando. Nós vamos produzir já pelo terceiro ano consecutivo mais de 60 arrobas por hectare em um módulo de 46 hectares. É um módulo fantástico. TIP, terminação intensiva a pasto. 60 arrobas. […] A lotação é muito alta, nós estamos hoje com 8,5 UA/ha. A nossa meta é estar sempre acima de 18 arrobas por hectare, mas, nesses módulos que nós estamos rodando, nós estamos com 360 bois rodando no módulo de 45,68 hectares. Nós vamos passar de 68 arrobas por hectare”, quantificou.
“Eu posso garantir para você: pode vir soja que não bate, não dá conta de ter o resultado, economicamente falando, igual ao que nós vamos ter nesses módulos que nós estamos rodando lá”, assegurou Dib.
O zootecnista destacou ainda benefícios indiretos do sistema. “Você diminui o estoque de animais, diminui a área que você precisa ter para colocar esses animais e termina o animal com melhor qualidade, com melhor aceitação pelo mercado. […] Você tem que investir, […] mas quando você faz a conta do número de animais que você precisa reduzir de quatro para dois anos a idade de abate e pelo número de área que você precisa reduzir, é assustadora a economia que você tem. O dinheiro que você deixa de colocar nessas áreas com esse mesmo número de animais, você consegue investir com eficiência para ter retorno. Mas vou abrir uma exceção: não é para qualquer tipo de gado. Nós precisamos ter uma genética que responda”, ressaltou.
A tarefa de implementar o boi 22-22 dentro da porteira fica distante, senão impossível, quando o produtor quer fazer a terminação de bezerros filhos de touros não provados. “Essa é uma preocupação que nós temos muito grande no nosso país. Nós temos ainda um percentual enorme de vacas expostas a bois de boiada. Mas tem que ter genética de qualidade”, confirmou.
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Ainda em sua entrevista ao Giro do Boi, Dib respondeu se o sistema 22-22 comporta também a engorda de bois cruzados. “Serve para cruzamento também. Nós trabalhamos com eficiência. Nós temos hoje animais de cruzamento com 20 meses terminando com 24 arrobas. Quando a gente fecha, a média é buscar um animal de até 24 meses. É isso que nós estamos buscando, um animal de até 24 meses que tenha pelo menos 21 arrobas, 22 arrobas.
CINCO PASSOS PARA PRODUZIR O BOI 22-22
O consultor indicou quais são os primeiros passos para o pecuarista que busca começar a intensificação do processo até chegar no 22-22. “A primeira coisa é a mudança de comportamento, a mudança de atitude, ter vontade. O segundo passo: trabalhar com genética de qualidade. A gente trabalha com a Agropecuária BSB, onde existe um trabalho muito focado. O seo Elson Castilho e o José Abel são muito sérios, executam um trabalho muito focado em ter eficiência. Nós precisamos colocar no mercado animais eficientes, então existe um processo de seleção muito intenso. Uma vez com a genética em nossa mão, nós conseguimos explorar. Sem genética não tem como fazer. O terceiro passo é ter uma excelente sanidade. O animal tem que estar são para explorar o potencial dele. Depois vêm os manejos, que é o que a gente está propondo. Uma proposta de recria intensiva para ganhar 700 g/dia, tranquilo. 710 a 720 g a pasto na recria estratégica, é super tranquilo. E 1,4 a 1,5 kg no confinamento. Nada que seja fora de ser factível. E uma boa nutrição. […] O ponto estratégico do gado de corte, o grande desafio, é a recria. É ela que encurta ou alonga o processo reprodutivo. É um dos pontos mais importantes desse processo”, orientou.
QUAL O OBJETIVO DO SISTEMA 22-22?
E engana-se quem pensa que o objetivo do sistema é termina o boi pesado e jovem somente para se enquadrar dentro do conceito de 22 arrobas aos 22 meses. “O objetivo chama-se ‘rentabilidade econômica’. Essa é a nossa proposta”, observou Dib.
O zootecnista colocou seu e-mail à disposição para os produtores que tiverem dúvidas sobre o boi 22-22: renato.dib@ueg.br.
A entrevista completa com Renato Dib pode ser assistida na íntegra pelo vídeo a seguir:
Foto ilustrativa: tourinhos da Agropecuária BSB que inspiraram o sistema 22-22.