Pecuarista é a maior salvação das onças no Brasil 

O Giro do Boi falou com o biólogo Leandro Silveira, fundador e presidente do Instituto Onça Pintada (IOP), que estuda o felino há mais de 30 anos

Um projeto audacioso está prestes a sair do papel: formar um super corredor ambiental ao longo dos três mil quilômetros do rio Araguaia, passando pelos Estados de Goiás, Mato Grosso, Tocantins e Pará. Serão cerca de 8 milhões de hectares de áreas de matas protegidas com um objetivo singular – ser o maior habitat natural para onças pintadas no País.

O público urbano pode até não saber, mas é justamente o produtor rural que mais está apoiando este projeto. A iniciativa é encabeçada pelo Instituto Onça Pintada (IOP), com sede em Mineiros (GO), em parceria com a JBS. A companhia, maior produtora de proteína animal do mundo, já identificou que nesta área há cerca de 2 mil fazendas que são capazes de ajudar na preservação da onça pintada.

Espécies de onças dentro do Instituto Onça Pintada, sediada no município de Mineiros (GO). Foto: Divulgação/Instituto Onça Pintada

Se para o público leigo, a parceria parece não fazer sentido, para quem estuda as onças há 30 anos, esse trabalho em conjunto pode representar o maior esforço de preservação de um animal em todo o planeta, segundo o biólogo Leandro Silveira, doutor em biologia animal, fundador e presidente do Instituto Onça Pintada (IOP), que há cerca de três décadas estuda este animal silvestre que é considerado o maior felino do continente americano.

“Apenas 4% da distribuição geográfica no Brasil está dentro de áreas protegidas, e mais de 85% das onças pintadas estão em áreas de produção em propriedades rurais. Moral da história: se formos seguir na biologia da conservação deste animal, teríamos de sair dos parques nacionais e ir para as propriedades privadas, porque, afinal de contas, se a vamos conservar a onça, dependemos do produtor rural”, diz Silveira.

Silveira (à dir.) e sua família na lida com animais silvestres. Foto: Divulgação/Instituto Onça Pintada

Silveira foi o entrevistado principal do Giro do Boi desta terça-feira, 10. Ele falou justamente sobre esta parceria com a JBS e o trabalho que ele e sua família vem desenvolvendo para monitorar e preservar esses animais.

Ter onças passeando pelas propriedades não podem ser encaradas com um risco iminente à produção, especialmente quando se fala na criação e engorda de bovinos, mas, sim, num elemento que eleva o status ambiental da fazenda.

“A onça é uma espécie que se torna um dos mais importantes bioindicadores. Isso significa que, onde há onça pintada, eu espero ter uma qualidade ambiental. Então se for uma área de produção eu tenho uma propriedade verdadeiramente sustentável e que não impacta o meio ambiente”, diz Silveira.

Mitos e verdades

Ao longo desse trabalho de cerca de 30 anos com este animal silvestre, Silveira passou a derrubar alguns mitos sobre as onças pintadas. Um deles, por exemplo, recai sobre o hábito alimentar do bicho.

Manejo de identificação de onças com sedação dos animais. Foto: Divulgação/Instituto Onça Pintada

Segundo ele, o senso comum diria que se a onça está predando os bezerros da propriedade é porque o pecuarista está desmatando áreas ou porque ele está matando animais de interesse deste felino. No entanto, essa não é uma verdade absoluta.

“A onça tende a predar o que é mais fácil. Então, quando ela vê um bezerro na frente dela, ele passa a ser mais fácil de se predar do que uma capivara ou um jacaré. Isso pode acontecer mesmo num ambiente que é rico em fauna. E quando a onça começa a predar o gado, isso gera um problema”, diz o biólogo.

Soluções de convivência

Para o especialista, a única forma de evitar que as onças saiam à caça da produção da fazenda é com a instalação de cercas elétricas. Elas podem ser eficazes para evitar a predação, mas não são absolutas.

Exemplar de onça identificada pelo IOP. Foto: Divulgação/Instituto Onça Pintada

A ideia dos corredores ambientais é uma grande saída, pois quanto maior for as áreas de preservação de matas, maior seria o número de onças vivendo ali e se reproduzindo. O trabalho por parte do pecuarista será bastante grande, pois ele estará sempre presente dentro deste corredor ambiental.

“O maior desafio da biologia da conservação é salvar os grandes predadores. É um animal que todo mundo quer preservar, mas as pessoas não se atentam que ele tem um custo para ser preservado”, diz o biólogo.

Certificação

Atualmente o Instituto Onça Pintada tem 400 mil hectares de propriedades certificadas e com uma boa aceitação por parte do produtor.

“O produtor tem de imaginar que a onça pintada em sua propriedade funciona como um super ativo, pois agrega mais valor ao seu produto. Temos de levar isso cada vez para as exportações de produtos agrícolas, pois estamos perdendo oportunidades”, afirma Silveira.

Confira a entrevista na íntegra:

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