“Qual é o papel da nutrição? Quais são as variações da maciez da carne frente a aspectos produtivos?”. Foi assim que apresentou o tópico de sua própria entrevista a mais um episódio inédito da série Embrapa em Ação o pesquisador da unidade Cerrados Eduardo Eifert, engenheiro agrônomo, mestre em zootecnia e doutor em nutrição de ruminantes.
Eifert começou explicando que um dos fatores em que a nutrição influencia a maciez da carne é na redução da idade ao abate. “O principal fator na maciez da carne é a idade de abate, seja em qualquer raça que está sendo criada. O papel da nutrição é primordial porque são as taxas de ganho de peso e as metas de peso atingidas pelos os animais que determinam a velocidade para eles serem abatidos em idade mais jovens. […] Quanto mais jovem o animal, teoricamente, na grande média, mais macia será a carne”, resumiu.
O pesquisador revelou que a nutrição atua sobretudo na parte que a maciez não está diretamente relacionada à genética, mas ao ambiente. “A maciez da carne é multifatorial. Você tem aspectos genéticos e aspectos ambientais. Dentro dos aspectos ambientais, envolvem a parte da preparação do animal para o abate, envolve o manejo pré-abate, as questões relacionadas a transporte e ao manejo no frigorífico até a embalagem final. Nós estamos trabalhando com planos nutricionais em que a gente usa suplementos desde idades mais jovens para atingir pesos de abate aos 24 meses, por exemplo”, comentou.
Além de antecipar a idade de abate, uma parte específica da nutrição reforça a maciez do produto final. Na suplementação, o contato mais próximo ao homem deixa o animal mais acostumado com a presença humana e, logo, menos estressado no momento do abate, o que reduz as chances de reatividade, estresse e queima de reservas de glicogênio que são essenciais para a transformação do músculo em carne ocorra de modo desejável.
“A gente faz a suplementação durante a época da seca e durante a época das águas não só durante o período de terminação. Nesse manejo da suplementação, é a oportunidade de o animal perder o medo do homem e de você fazer boas práticas de manejo dos animais. Com isso, os animais se tornam mais dóceis, mais calmos e vão ser preparados de uma maneira diferente na hora de chegar ao abate. Eles vão estar mais calmos, não serão aqueles animais arredios que teriam problemas de carne mais dura. […] Você também minimiza perdas quantitativas de carcaça por causa de traumas ou choques. Então toda a questão envolvendo a maciez da carne, a nutrição também está relacionada ao manejo e às práticas adotadas”, explicou.
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Mais adiante na cadeia de produção, a nutrição também serve à maciez da proteína protegendo na hora do resfriamento da carcaça. “Existe um fenômeno chamado cold shortening, em inglês, ou encurtamento das fibras musculares pelo frio, em português. Logo depois do abate, as carcaças são encaminhadas para a câmara fria para serem resfriadas e sofrer uma redução de pH no músculo, a partir de glicogênio, em que esse músculo se transforma em carne. E para isso, as câmaras frias injetam ar frio […]. Esse vento e ar frio fazem com que as fibras se encurtem e isso pode tornar duras as carnes. Por isso o grau de acabamento das carcaças é extremamente importante. A homogeneidade da carcaça quando você a vê pendurada, a homogeneidade dessa gordura protege a carcaça daquele ar frio que vem chegando”, ressaltou o doutor em nutrição de ruminantes.
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Segundo Eduardo, o Brasil está atingindo um patamar em que as qualidades intrínsecas da carne ganham mais relevância do que o mero peso das carcaças e, por isso, prestar atenção nas variáveis que levam ao aumento de maciez, por exemplo, é importante.
“Alguns países, principalmente os nossos vizinhos do Cone Sul, como Uruguai e Argentina, já não trabalham mais com o peso de abate, eles querem uma qualidade da carcaça ao ser abatida. Eles trabalham com raças diferentes, com raças britânicas, mas nós estamos chegando, com o nosso zebuíno, a um potencial tal e qual o deles. Não só em cruzamentos com raças britânicas, mas também trabalhando os nossos animais zebuínos. Então o peso de abate é determinante porque você vai auferir mais recurso por quilo de carcaça, mas ao mesmo tempo existe ainda uma abertura para novos mercados para aquelas carcaças mais bem acabadas, mesmo que não tenham tanto peso. Talvez um animal com menor tamanho, mas com gordura suficiente e com potencial de carne macia. E essa maciez envolve questões genéticas e ambientais. Tudo isso está dentro do manejo dessas carcaças”, projetou.
Eifert revelou que já percebe mudanças rumo a este futuro dentro das fazendas de gado de corte brasileiras. “O que a gente vê? Cada vez mais produtores se preocupando com instalações de bem-estar animal, curralama de bem-estar animal, onde você não tem canto, não tem canto de cerca, que facilita tanto a vida do peão quanto o próprio animal, que estressa menos. A própria sombra, que estressa menos, reflete em uma menor frequência cardíaca, uma menor taxa de respiração. Todas estas questões estão envolvidas. E dentro do frigorífico também estão ficando cada vez mais intensas as preocupações, também junto ao SIF, em relação ao bem-estar. Isso não garante totalmente, mas só nos traz maior confiabilidade para produzir uma carcaça com carne mais macia”, observou.
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“A maciez da carne é determinada por questões genéticas e ambientais. Dentro da parte ambiental, o ponto crucial é a idade do abate. Se nós não sabemos qual é a origem genética dos animais, se geneticamente esse animal tem potencial para carne macia ou não, nós devemos tratar todos os animais da mesma maneira. E tratando da mesma maneira, a gente atinge peso de abate e qualidade de carcaça com bom acabamento com um bom manejo dentro dos 24 meses. Muito possivelmente a nossa pecuária esteja ainda evoluindo e nós vamos conseguir reduzir mais esse tempo até chegar no boi acabando, talvez, aos 18 meses de idade. Essa vai ser a evolução, o futuro da nossa pecuária. É o mercado que vai dizer isso, mas basicamente nós temos que trabalhar, por enquanto, todas as carcaças da mesma forma, reduzindo a idade de abate”, resumiu pesquisador da Embrapa Cerrados.
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Assista a entrevista completa com Eduardo Eifert: