Desempenho do boi confinado depende das “boas-vindas” no local de engorda

Zootecnista destacou qual o primeiro “agrado” a ser oferecido para os lotes recém-chegados e destacou que tecnologia não substitui o manejo racional

Assim como ser bem recebido num hotel, conhecendo as instalações e atrações do local, faz diferença para a estadia de um hóspede, o conceito pode ser também aplicado ao confinamento de gado de corte. Nesta sexta-feira, dia 28, o Giro do Boi levou ao ar entrevista com o zootecnista Bruno Cappellozza, gerente de pesquisa e desenvolvimento de produtos da Nutricorp, a respeito da importância das boas práticas no protocolo de entrada do boi que será engordado em cocho para o seu desempenho ao longo da fase de terminação.

+ Agrônomo recomenda que pecuarista trate seu boi como “hóspede” na fazenda

“É um conjunto. Seria uma série de fatores que vão desde transporte, desde o embarque da fazenda de origem, até o processamento e entrada no confinamento, que podem causar uma reação de estresse no animal. A gente pode elencar o manejo na fazenda de origem, o transporte em si, a variação climática pela qual o animal pode passar durante o transporte… Outro ponto importante que é negligenciado ou pouco falado é a restrição de água e comida durante o transporte. A gente está falando de situações em que os animais ficam mais de 24 horas sendo transportados e, durante aquele período, eles não têm acesso a água, a comida. Na chegada ao confinamento, por exemplo, no processamento, […] às vezes o operacional faz com que os lotes de diferentes unidades ou diferentes fazendas sejam agrupados e isso vira uma bagunça, porque tem animal de um lado querendo ser o dominante, do outro lado também, então tem briga, tem montação, a montação a gente sabe que leva a fratura, leva a machucados, contusões na carcaça. Aí a gente já está elencando diversos manejos ou situações que levam ao estresse. É importante cuidar disso porque estamos falando de um período curto de tempo. A gente está falando que tudo isso pode acontecer num período de 24 a 48 horas”, lembrou Cappellozza.

+ Você sabe como receber o gado no confinamento após o desembarque?

O especialista comentou também os recentes avanço do setor para corrigir algumas dessas falhas. “Treinamento de equipe em manejo racional, algo que as empresas vêm desenvolvendo. O uso de caminhões que cada vez mais se adequam ao bem-estar do animal, seja a nível de estrutura, como fazer o transporte, jornada… Tudo isso leva a melhoria desse bem-estar animal. O processamento na fazenda é uma coisa totalmente importante, acesso a uma comida de boa qualidade, água limpa”, exemplificou.

+ Giro na Estrada conta “saga” de bezerros que viajaram 4.500 km do Acre à Bahia

+ De SP ao AC: veja a saga do transporte boiadeiro em uma viagem de mais de 3 mil km

O zootecnista apontou qual é a primeira medida de boas-vindas que o pecuarista deve preparar na chegada de um novo lote de animais a serem confinados em sua propriedade. “Quando o animal está estressado, isso é muito visual. A primeira coisa que ele faz após uma situação de estresse, – e é lógico que eu estou generalizando, pois sempre tem algumas particularidades – de maneira geral, […] ele vai beber água. Mas se ele não tem água limpa, a gente já está causando um outro momento de estresse para o animal. Então o transporte em si ou a estrutura do caminhão é extremamente importante, mas isso também envolve manejo, acesso a água e comida de boa qualidade, o manejo racional tanto no embarque e desembarque, quanto no processamento. Evitar abscessos de vacinas, porque a vacina em si causa uma lesão no tecido do animal que também leva a uma resposta de estresse, a uma reação inflamatória”, ilustrou o especialista.

Como vencer o desafio do bem-estar na entrada do boi no confinamento?

Saiba como fazer aclimatação e adaptação de bovinos ao confinamento

Cappellozza alertou que há um período crítico de adaptação dos animais ao novo ambiente de terminação e que pode definir o seu desempenho ao longo de todo o período de engorda. “A gente pensando no desempenho, lógico, nesses primeiros 15 dias, vamos dizer, no período de adaptação do animal ao confinamento. […] Um exemplo que eu posso dar é o problema de pneumonia nesse momento. A gente sabe que os casos de pneumonia acabam se concentrando nessas primeiras três ou quatro semanas de confinamento porque o sistema imune do animal está mais baixo, então ele está imunossuprimido por essa reação de estresse e aqueles patógenos que causam pneumonia, que já estão lá no trato respiratório, aproveitam essa queda da imunidade para causarem impacto negativo”, observou.

Entenda o tamanho do prejuízo das doenças respiratórias em gado de corte

+ Sabia que boi também sente azia? Veja como se livrar da acidose do rúmen

A partir de então, começa uma reação em cadeia que termina com um buraco no bolso do pecuarista. “Isso está totalmente correlacionado. Os animais que têm ocorrência de pneumonia no início do confinamento têm queda de desempenho e têm queda no retorno econômico da operação como um todo. É quase que um efeito 1:1. À medida que eu aumento o tratamento para pneumonia, minha rentabilidade com a operação cai quase que linearmente. No final, a gente está falando em desempenho geral e com certeza será uma carcaça que pode ter mais problemas de abscesso, o estresse no final pode levar à ocorrência de alteração de pH […] e, por exemplo, um dos fatores que o mercado de boi China considera é o pH. Então se eu tenho um estresse muito grande para o embarque, se alterou o pH da carcaça muito para cima, essa carcaça não será destinada ao mercado externo e cai o retorno tanto para o frigorífico quanto para o produtor, que acaba recebendo menos por essa carcaça”, explicou.

+ Boi que morre em confinamento leva embora o lucro de até 16 animais saudáveis

Segundo Cappellozza, as falhas nas “boas-vindas” do confinamento à nova “excursão de hóspedes” não podem ser corrigidas com tecnologia. “Uma coisa que a gente sempre deixa claro é que não há tecnologia que substitua ou corrija o manejo mal feito. A gente tem, sim, um produto bem específico, que a gente vem trabalhando de uma maneira bem técnica no campo, com uma tecnologia que é chamada Secure Cattle, cujo foco está na redução de estresse. Mas o que a gente às vezes acaba ouvindo e conversando é que o produtor acredita que aquela tecnologia é um milagre. Não, não existe milagre na pecuária! Se o pecuarista não tem um bom manejo, se ele não tem bons processos definidos dentro da operação, pode vir até o Papa benzer que não tem jeito. Do mesmo jeito que a gente não aponta o dedo para um fator só, o manejo e as tecnologias como um todo têm que ser trabalhados de forma conjunta para, aí sim, aparecerem os benefícios da sanidade, da genética e da nutrição”, analisou o zootecnista.

+ Tecnologia não substitui o bom manejo, afirma Temple Grandin

Boi estressado esconde doença e dificulta diagnóstico

A entrevista completa com Bruno Cappellozza pode ser vista clicando no player disponível abaixo:

Sair da versão mobile